1493 – Roma
Na
penumbra do Vaticano, cheirando a perfumes do Oriente, o papa dita
uma nova bula.
Faz
pouco tempo que Rodrigo Borgia, valenciano da aldeia de Xátiva, se
chama Alexandre VI. Não passou ainda um ano desde que comprou, à
vista, os sete votos que faltavam no Sagrado Colégio e pôde mudar a
púrpura de cardeal pelo manto de arminho de Sumo Pontífice.
Mais
horas dedica Alexandre VI a calcular o preço das indulgências que a
meditar o mistério da Santíssima Trindade. Ninguém ignora que
prefere as missas breves, salvo as que em sua alcova privada celebra,
mascarado, o bufão Gabriellino, e todo mundo sabe que o novo papa é
capaz de desviar a procissão de Corpus para que passe debaixo da
varanda de uma mulher bonita.
Também
é capaz de cortar o mundo como se fosse um frango: ergue a mão e
traça uma fronteira, de cabo a rabo no planeta, através do mar
incógnito. O procurador de Deus concede à perpetuidade tudo o que
tenha sido descoberto ou se descubra, a oeste dessa linha, a Isabel
de Castilha e a Fernando de Aragão e a seus herdeiros no trono
espanhol. Encomenda-lhes que às ilhas e terras firmes encontradas ou
por encontrar enviem homens bons, temerosos de Deus, doutos, sábios
e experientes, para que instruam os naturais na fé católica e lhes
ensinem bons modos. À coroa portuguesa pertencerá o que se descubra
ao leste.
Angústia
e euforia das velas abertas: Colombo já está preparando, na
Andaluzia, sua segunda viagem para os rincões onde o ouro cresce em
cachos nas parreiras e as pedras preciosas aguardam no crânio dos
dragões.
Eduardo Galeano, in Os Nascimentos
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