Eu
me recostava no balcão do bar do Musso’s. Sarah tinha ido ao
toalete de senhoras. Eu gostava do bar do Musso’s, do bar como bar,
mas não da sala onde ficava. Era conhecido como “Sala Nova”. A
“Sala Velha” ficava do outro lado, e eu preferia comer lá. Era
mais escuro e tranquilo. Nos velhos tempos, eu ia à Sala Velha
comer, mas raramente comia mesmo. Apenas olhava o menu e dizia ao
pessoal “Ainda não”, e continuava a pedir bebidas. Algumas das
damas que eu levava lá eram de má reputação, e enquanto a gente
bebia, sem parar, estouravam muitas discussões aos berros, cheias de
xingamentos, bebidas derramadas e pedidos de outras. Eu geralmente
passava às damas o dinheiro do táxi, mandava-as dar o fora e
continuava bebendo sozinho. Duvido que usassem o dinheiro do táxi em
táxis. Mas uma das coisas mais legais do Musso’s era que quando eu
voltava, depois da trepada, geralmente me recebiam com sorrisos
calorosos. Muito estranho.
De
qualquer modo, eu me recostava no balcão do bar e a Sala Nova estava
cheia, a maioria turistas, que batiam papo, torciam o pescoço e
emitiam raios da morte. Pedi um novo drinque e então me bateram no
ombro.
– Chinaski,
como vai você?
Virei-me
e olhei. Jamais reconheci alguém. Podia encontrar uma pessoa na
noite passada e não lembrá-la no dia seguinte. Se arrancassem minha
mãe da cova, eu não saberia quem era ela.
– Estou
bem – disse. – Posso te pagar uma bebida?
– Não,
obrigado. Não nos conhecemos. Eu sou Harold Pheasant.
– Oh,
sim. Jon me disse que você estava pensando em...
– É,
quero financiar seu argumento. Li sua obra. Você tem um maravilhoso
senso de diálogo. Li sua obra: muito cinematográfica.
– Tem
certeza de que não quer um drinque?
– Não,
preciso voltar pra minha mesa.
– Ah,
é? Que tem feito ultimamente, Pheasant?
– Acabo
de produzir um filme sobre a vida de Mack Derouac.
– É?
Como se chama?
– A
Canção do Coração.
Tomei
um gole.
– Ei,
espere um minuto! Você está brincando! Não vai chamar o filme de A
Canção do Coração.
– Oh,
sim, é assim que vai se chamar.
Ele
sorria.
– Você
não pode me enrolar, Pheasant. É mesmo um gozador! A Canção do
Coração! Nossa!
– Não
– ele disse. – Estou falando sério.
De
repente deu as costas e foi-se embora...
Nesse
momento Sarah voltava. Olhou para mim.
– De
que está rindo?
– Me
deixa pedir um drinque pra você que eu te conto.
Chamei
o garçom e pedi um também para mim.
– Adivinha
quem eu vi na Sala Velha – ela disse.
– Quem?
– Jonathan
Winters.
– Ééé?
Adivinha com quem conversei enquanto você estava lá.
– Uma
de suas ex-putas.
– Não,
não. Pior.
– Não
tem nada pior que elas.
– Conversei
com Harold Pheasant.
– O
produtor?
– É,
está ali naquela mesa do canto.
– Oh,
estou vendo!
– Não,
não olhe. Não acene. Beba seu drinque. Eu bebo o meu.
– Que
diabos deu em você?
– Sabe,
ele é o produtor que ia produzir o argumento que eu não escrevi.
– Eu
sei.
– Quando
você saiu ele veio conversar comigo.
– Já
disse isso.
– Não
aceitou nem um drinque.
– Então
você fodeu tudo e não está nem bêbado.
– Espere.
Ele queria falar de um filme que acaba de produzir.
– Como
foi que você fodeu tudo?
– Eu
não fodi nada. Ele fodeu.
– Claro.
Conta pra mim.
Olhei
no espelho. Gostava de mim mesmo, mas não no espelho. Não tinha
aquela aparência. Acabei meu drinque.
– Acabe
seu drinque – disse.
Ela
acabou.
– Conta
pra mim.
– É
a segunda vez que você diz: “Conta pra mim”.
– Memória
notável, e nem está bêbado ainda.
Fiz
sinal para o garçom, tornei a pedir.
– Bem,
Pheasant veio aqui e me falou do tal filme que produziu. É sobre um
escritor que não sabia escrever mas ficou famoso porque parecia um
peão de rodeio.
– Quem?
– Mack
Derouac.
– E
isso chateou você?
– Não,
isso não importa. Estava ótimo, até ele me dizer o título do
filme.
– Que
era?
– Por
favor, estou tentando varrer da minha cabeça. É absolutamente
idiota.
– Diz
pra mim.
– Tá
legal...
O
espelho ainda estava lá.
– Diz
pra mim, diz pra mim, diz pra mim.
– Tudo
bem: O Voo do Destroço Peludo.
– Eu
gosto.
– Eu
não gostei. E disse a ele. Ele se mandou. A gente perdeu o
patrocinador.
– Você
deve ir lá se desculpar.
– De
jeito nenhum. Título horrendo.
– Você
queria era que o filme fosse sobre você.
– É
isso aí! Vou escrever um argumento sobre mim mesmo!
– Já
tem o título?
– Já:
Moscas no Destroço Peludo.
– Vamos
sair daqui.
Com
essa, saímos.
Charles Bukowski, in Hollywood
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