O
pai cavando o chão mostrou pra nós,
com
o olho da enxada, o bicho bobo,
a
cobra de duas cabeças.
Saía
dele o cheiro de óleo e graxa,
cheiro
suor de oficina, o brabo cheiro bom.
Nós
tínhamos comido a janta quente
de
pimenta e fumaça, angu e mostarda.
Pisando
a terra que ele desbarrancava aos socavões,
catava
tanajuras voando baixo,
na
poeira de ouro das cinco horas.
A
mãe falou pra mim: “Vai na sua avó buscar polvilho,
vou
fritar é uns biscoitos pra nós”.
A
voz dela era sem acidez. ‘Arreda, arreda’,
o
pai falava com amor.
As
tanajuras no sol, a beira da linha,
o
verde do capim espirrando entre os tijolos
da
beirada da casa descascada, a menina embaraçada
com
a opressão da alegria, o coração doendo,
como
se triste fosse.
Adélia Prado, in Bagagem
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