Um
medo danado de nunca mais me deparar
com
aquela frase. Depois passei a achar que
os
grifos direcionavam muito as releituras.
E
os substituí por microdobradinhas nas
páginas.
(Cocteau: “Uma única frase, e o
poema
todo é levado aos céus!”.) Mas se
este
método tem a provável vantagem de
atenuar
a arbitrariedade e a feiura dos grifos,
algumas
vezes, no entanto, ao reler estas
páginas,
não encontrava o motivo delas
terem
sido condecoradas com a dobradinha,
ou
achava mais de um motivo para tanto.
Coisas
de louco com as quais, bem ou mal,
“abastecemos
nossa obsessão” (Philip Roth).
Penso
até que a literatura se alimenta desse
medo.
(Waly Salomão: “Escrever é se vingar
da
perda”.) Afinal, de onde vêm os versos
senão
dos grifos e dobradinhas que aplicamos
na
existência, momentos que roubamos do mundo,
instantes
que nossas solidões recrutam para
(W.B.
Yeats) o “imundo ferro-velho do coração”?
Marcelo Montenegro, in Forte Apache
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