Quando
o canal corporal ajuda a difundir as emoções de um indivíduo para
outro, não se trata apenas de bocejar ou imitar, mas de sentir o que
os outros sentem. Mesmo que ainda esteja enraizado em conexões
corporais, aqui estamos chegando perto da verdadeira empatia. O
contágio emocional, como é conhecido, começa no nascimento,
quando um bebê chora ao ouvir outro bebê chorar. Nos aviões e nas
maternidades, os bebês às vezes fazem coro como sapos. Pode-se
pensar que eles choram em reação a qualquer tipo de ruído, mas
estudos mostraram que reagem especificamente aos gritos de bebês da
mesma idade. Bebezinhas o fazem mais do que bebezinhos. O fato de
isso surgir tão cedo revela a natureza biológica da cola emocional
da sociedade. É uma capacidade que compartilhamos com todos os
mamíferos.
Na
vida real, uma fêmea de orangotango selvagem balançará habilmente
de uma árvore alta para outra. Seu filhote pequeno, tentando
segui-la através da copa das árvores, para de repente: o espaço
entre as duas árvores seguintes é grande demais. Ele choraminga e
pede desesperadamente a ajuda da mãe. Ao ouvi-lo, ela pode
choramingar e voltar para fazer uma ponte que ajude o jovem. Ela pega
o galho de uma árvore com uma das mãos e o galho de outra árvore
com a outra mão ou com o pé, depois puxa as duas árvores para mais
perto uma da outra enquanto fica agarrada entre elas, permitindo que
o filhote cruze usando seu corpo como ponte viva. Essa sequência
corriqueira é impulsionada pelo contágio emocional — a mãe fica
angustiada com os gemidos de seus filhos — combinado com a
inteligência, que permite à mãe entender o problema e encontrar
uma solução.
Mais
surpreendente é a atração de emoções negativas. Seria de esperar
que os sinais de medo e aflição fossem altamente aversivos, mas um
estudo recente descobriu que os ratos são na verdade atraídos por
outros ratos com dor.21 Estou bastante familiarizado com esse
fenômeno em macacos rhesus jovens. Certa vez, um bebê caiu
acidentalmente sobre uma fêmea dominante, que o mordeu. Ele gritou
tanto que logo foi cercado por outros filhotes. Eu contei oito deles
na pilha de bebês, todos subindo sobre a pobre vítima, empurrando,
puxando e jogando uns aos outros para o lado. Isso obviamente fez
pouco para aliviar o medo do primeiro bebê. Mas a resposta dos
macacos parecia automática, como se eles estivessem tão perturbados
quanto a vítima e procurassem consolar um ao outro.
Porém,
essa talvez não seja toda a história. Se esses bebês macacos
estavam tentando se acalmar, por que precisariam se aproximar da
vítima, em vez de correr para suas mães? De fato, eles procuraram a
fonte real de aflição, em vez de uma fonte garantida de conforto.
Bebês macacos fazem isso o tempo todo sem qualquer indicação de
que sabem o que está acontecendo. Eles parecem atraídos para o
sofrimento dos outros como mariposas para a luz.
Gostamos
de ler preocupação nesse tipo de comportamento, mas eles
provavelmente não entendem o que aconteceu com o primeiro bebê. Eu
chamo esse tipo de atração cega para aqueles que estão em apuros
de pré-preocupação. É como se a natureza tivesse dotado crianças
e muitos animais de uma regra simples: “Se você sentir a dor de
outra pessoa, vá até lá e faça contato!”. É bom perceber,
entretanto, que qualquer teoria de autopreservação estrita preveria
exatamente o oposto. Se os outros ao seu redor estiverem gritando e
choramingando, há uma boa chance de estarem em perigo, portanto o
mais sensato seria se retirar. O mesmo se aplica aos sons de aflição.
Se gritos agudos irritam seu ouvido, a coisa lógica a fazer é tapar
os ouvidos ou se afastar. Mas muitos animais fazem o oposto — se
aproximam para descobrir o que está acontecendo, mesmo quando os
sons de dor são quase inaudíveis. O ponto é o estado emocional do
outro. O fato de que ratos, macacos e muitos outros animais procurem
ativamente aqueles que estão com problemas não se encaixa em
cenários puramente egoístas, e prova o defeito fundamental das
teorias sociobiológicas populares nas décadas de 1970 e 1980.
Em
representações sociobiológicas da natureza como um lugar de
competição selvagem, todo comportamento se resumia a genes
egoístas, e as tendências egoístas eram invariavelmente atribuídas
à “lei do mais forte”. A gentileza genuína estava fora de
questão, porque nenhum organismo seria tão estúpido a ponto de
ignorar o perigo para ajudar o outro. Se tal comportamento ocorresse,
deveria ser uma miragem ou um produto de genes “defeituosos”. A
infame frase que resumia essa época — “Arranhe um altruísta e
verá um hipócrita sangrar”22 — foi citada repetidas vezes com
certo regozijo: o altruísmo, dizia-se, deve ser uma farsa. A frase
era usada para repelir românticos inveterados e idealistas ingênuos
que acreditavam na bondade humana. Não por coincidência, foi também
a época de Ronald Reagan e Margaret Thatcher, assim como de Gordon
Gekko, o personagem fictício do filme Wall Street, de 1987: Gekko
acreditava que a cobiça era o que fazia o mundo girar. Quase todo
mundo estava correndo atrás de uma ideia simples, claramente em
desacordo com a forma como os animais sociais, inclusive os seres
humanos, foram moldados pela seleção natural.
Felizmente,
não se fala mais sobre “genes egoístas”. Enterrada por uma
massa de novos dados, a ideia de que o comportamento é
invariavelmente egoísta teve uma morte inglória. A ciência
confirmou que a cooperação é a primeira e mais importante
inclinação da nossa espécie, pelo menos a cooperação com os
membros do grupo de pertencimento, tanto que um livro sobre o
comportamento humano de Martin Nowak, publicado em 2011, tinha por
título SuperCooperators: Altruism, Evolution, and Why We Need
Each Other to Succeed [Supercooperadores: altruísmo, evolução
e por que precisamos um do outro para ter sucesso]. Quando as pessoas
que participaram de um experimento de neuroimagem tiveram escolha
entre uma opção egoísta e uma opção altruísta, a maioria optou
pela segunda. Elas preferiam a escolha egoísta se houvesse boas
razões para evitar a cooperação. Muitos estudos corroboram essa
visão, dizendo que tendemos a ser gentis e abertos aos outros, a
menos que algo nos detenha. Às vezes brinco que deve ser por isso
que Ayn Rand, a romancista e aspirante a filósofa russo-americana,
precisava daqueles volumes pesados tão entediantes, cheios de
personagens frios, para defender sua posição. O argumento principal
dela é que somos individualistas absolutos, mas ela teve de se
esforçar muito para nos convencer, porque no fundo todos sabem que
não somos assim. Em vez de uma descrição de nossa espécie, Ayn
Rand ofereceu uma construção ideológica contraintuitiva.
O
modo de vida padrão do primata humano é intensamente social, como
mostram nossas atividades favoritas, desde assistir a jogos
esportivos e cantar em coros até festejar e sociabilizar. Uma vez
que derivamos de uma longa linhagem de animais que vivem em grupo,
que sobreviveram ajudando uns aos outros, essas tendências são
inteiramente lógicas. Andar sozinho nunca funcionou para nós.
Nadia
Ladygina-Kohts forneceu um exemplo típico da natureza propensa ao
social de nossos parentes primatas, incluindo a atração pelos
sinais de aflição, em seu chimpanzé adotivo, Joni:
Se
eu fingir que estou chorando, fechar os olhos e lacrimejar, Joni
interrompe imediatamente sua brincadeira ou qualquer outra atividade,
corre depressa para mim, todo agitado e exaurido, dos lugares mais
remotos da casa, como o telhado ou o teto de sua gaiola, de onde eu
não conseguia tirá-lo, apesar de meus chamados e súplicas
persistentes. Ele corre apressadamente ao meu redor, como se
procurasse o ofensor; olhando para o meu rosto, pega carinhosamente
meu queixo na palma da mão, toca de leve o meu rosto com o dedo,
como se tentasse entender o que está acontecendo, e se vira,
firmando os dedos dos pés como punhos cerrados.
Que
melhor prova da compaixão dos símios do que o fato de que um
chimpanzé que se recusava a descer do telhado em troca de comida o
fez instantaneamente ao ver sua dona sofrer? Quando Nadia fingia
chorar, Joni olhava nos olhos dela, e “quanto mais triste e
desconsolado meu choro, mais calorosa sua compaixão”. Quando ela
pôs as mãos sobre os olhos, ele tentou afastá-las, estendeu os
lábios para o rosto dela, olhou-a com atenção, gemendo e
choramingando levemente.
Quando
animais ou crianças começam a entender o que está acontecendo com
uma pessoa que sofre, eles deixam para trás a atração cega e
demonstram preocupação empática. Tentam aliviar a dor, como Joni
fez com Nadia Kohts. É também a maneira como os pais humanos reagem
quando seus filhos esfolam o joelho, batem com a cabeça ou levam
tapas ou mordidas de outra criança. A maneira mais rápida de
fazê-los parar de chorar é beijar o local dolorido.
O
desenvolvimento inicial desse comportamento foi estudado em nossa
espécie filmando crianças em suas casas. O pesquisador pede a um
parente adulto que finja chorar ou aja como se estivesse com dor, a
fim de ver o que as crianças fazem. No filme, as crianças parecem
preocupadas enquanto se aproximam do adulto aflito. Elas gentilmente
tocam, acariciam, abraçam ou beijam o adulto. As meninas fazem isso
mais do que os meninos. O achado mais importante foi que essas
respostas surgem muito cedo, antes dos dois anos de idade. O fato de
que crianças pequenas já expressem empatia sugere que se trata de
algo espontâneo, porque é improvável que alguém as instrua sobre
como reagir.
Para
mim, a verdadeira revelação foi que as crianças se comportavam
exatamente como os símios, que não só se aproximam de alguém
aflito, como passam pela mesma rotina de tocar, abraçar e beijar.
Após assistir a filmes do estudo humano, percebi de imediato que o
tempo todo estive pesquisando uma preocupação empática: por que
deveria adotar uma terminologia diferente? Muitos animais, de cães a
roedores, de golfinhos a elefantes, exibem um comportamento
reconfortante, embora cada espécie use seus próprios gestos. Nas
mesmas casas onde as crianças foram filmadas, os psicólogos
descobriram acidentalmente que os cães também reagiam à pessoa
aflita pondo a cabeça no colo dela ou lambendo seu rosto. Esse
comportamento foi depois confirmado por estudos mais direcionados.
Como
era de esperar, nem todo mundo gostou de ver a descrição de cães e
macacos como seres empáticos, mas ao longo dos anos a resistência
diminuiu. A ideia de empatia animal está agora razoavelmente bem
estabelecida. Afinal, ninguém está afirmando que os cães têm
todas as capacidades mentais que os humanos põem em ação para
entender os outros. Muitos níveis diferentes marcam a empatia. Mas
podemos certamente reconhecer nos cães sensibilidade para as emoções
dos outros, a adoção de emoções semelhantes e expressões de
preocupação. Esse é o motivo pelo qual consideramos o cão o
melhor amigo do homem, afinal. Nos primatas, a empatia é tão óbvia
e comum que agora há dezenas de estudos que examinaram a
“consolação”, a tendência para confortar e tranquilizar
aqueles que passaram por uma experiência dolorosa. Para documentar
como os primatas se consolam, simplesmente esperamos por um incidente
espontâneo que lhes provoque estresse — uma briga, uma queda, uma
frustração —, e então observamos como os outros os consolam. O
consolo através do contato corporal tem um efeito calmante e é
típico de relacionamentos sociais íntimos. É também muito eficaz.
Em um momento, uma primata está gritando a plenos pulmões e
estapeando-se com movimentos espasmódicos do braço, batendo nas
laterais do corpo numa birra barulhenta porque não conseguiu a
comida que estava implorando. No momento seguinte, enquanto uma amiga
a mantém apertada num abraço, seus gritos diminuem para gemidos
suaves.
Uma
vez que o comportamento de consolação não é de forma alguma
limitado a bonobos e chimpanzés, fiquei feliz quando um dia um aluno
que entrou para minha equipe disse que queria estudar elefantes. Com
Josh Plotnik, observamos o maior mamífero terrestre, conhecido por
seus laços sociais e assistência mútua. Em um santuário ao ar
livre no norte da Tailândia, onde elefantes asiáticos resgatados
vagam em semiliberdade, uma elefanta chamada Mae Perm corria para o
lado de sua amiga, uma elefanta cega chamada Jokia, sempre que esta
precisava: agia como se fosse o seu cão-guia. As duas estavam sempre
em contato vocal, bramindo e ribombando uma para a outra. Se Jokia
estivesse irritada ou assustada com qualquer coisa, como o bramido de
um elefante macho ou o barulho de trânsito distante, as duas
elefantas estendiam as orelhas e erguiam as caudas. Mae Perm podia
emitir chilreios tranquilizantes e acariciar Jokia com a tromba, ou
colocá-la na boca de Jokia. Isso a deixava imensamente vulnerável
(nada é mais sensível e importante para um elefante do que a ponta
da tromba), mas validava sua confiança na outra. Jokia fazia o
mesmo, pondo a tromba na boca de Mae Perm, mostrando que a confiança
era mútua.
Se
outros elefantes estivessem por perto, eles podiam reagir da mesma
maneira agitada que Jokia: levantavam as caudas, abanando as orelhas,
às vezes urinavam e defecavam durante o gorjeio. E se posicionavam
num círculo protetor ao redor dela.
Josh
encontrou amplas provas de contágio emocional e consolação nesses
paquidermes. No entanto, muitas pessoas consideram sua existência
tão evidente que às vezes lhe perguntavam por que seus estudos eram
necessários. Todo mundo não sabe que os elefantes têm empatia? De
certa forma, fico feliz ao ouvir essa pergunta, porque mostra como a
ideia de empatia animal se tornou bem estabelecida. Mas a ciência
progride em meio a um enorme ceticismo, e quem se lembra da feroz
resistência a essa ideia, como eu certamente lembro, percebe que,
sem dados sólidos, ela nunca teria se consolidado. Mas
definitivamente isso aconteceu, da mesma forma que agora aceitamos
que o coração bombeia sangue e que a Terra é redonda. Não podemos
nem imaginar que as pessoas costumavam pensar de outra forma.
Contudo,
mesmo depois de chegar a esse ponto em relação à sensibilidade
emocional dos mamíferos, ainda precisamos de estudos para aprender
como ela funciona e em quais circunstâncias encontra expressão,
porque a empatia nunca é a única opção. Mae Perm, por exemplo,
não deixava de se aproveitar da cegueira de Jokia para roubar a
comida dela.
Compreender
a deficiência do outro também oferece maneiras de explorá-la.
Frans de Wall, in O último abraço da matriarca
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