Desde
que começou a envelhecer realmente começou a querer ficar em casa.
Parece-me que achava feio passear quando não se era mais jovem: o ar
tão limpo, o corpo sujo de gordura e rugas. Sobretudo a claridade do
mar como desnuda. Não era para os outros que era feio ela passear,
todos admitem que os outros sejam velhos. Mas para si mesma. Que
ânsia, que cuidado com o corpo perdido, o espírito aflito nos
olhos, ah, mas as pupilas essas límpidas.
Outra
coisa: antigamente no seu rosto não se via o que ela pensava, era só
aquela face destacada, em oferta. Agora, quando se vê sem querer ao
espelho, quase grita horrorizada: mas eu não estava pensando nisso!
Embora fosse impossível e inútil dizer em que o rosto parecia
pensar, e também impossível e inútil dizer no que ela mesma
pensava.
Ao
redor as coisas frescas, uma história para a frente, e o vento, o
vento... Enquanto seu ventre crescia e as pernas engrossavam, e os
cabelos se haviam acomodado num penteado natural e modesto que se
formara sozinho.
Clarice Lispector, in Todas as crônicas
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