Todas
as manhãs, mamãe me confiava a minha avó, que na adolescência
apelidei de Cochise, em homenagem a um célebre chefe indígena.
A
avó, portanto.
Era
ela o chefe supremo da família. Como uma guerreira apache, fazia
valer a lei de ferro sobre suas tropas dispersas. Quase cega, vovó
Cochise se quedava ereta e imóvel, atrás de um véu invisível para
os outros. Era uma mulher robusta de traços finos, mirrada pela
velhice. Tinha a audição, o paladar e o olfato melhores que os de
todo mundo. Sua testa era devastada por rugas, sua face mais
amarrotada que a pele de um camaleão. Suas sobrancelhas se franziam
assim que ela escutava minha voz fina. Tinha o faro de um cão
perdigueiro e me farejava antes de me reconhecer. Bastava ela
estender os braços e me agarrar pela pele da nuca como uma gata faz
com seu gatinho. Sem esforço, ela me punha no colo. E eu só podia
fazer uma coisa: agarrar-me a ela para me acalmar. Não devia me
mexer nem derramar uma lágrima. Mas era impossível. Eu havia
nascido com os olhos úmidos e vermelhos. Não resistia muito tempo.
Implacável, a sanção caía sobre meus ombros.
Cada
fungado era seguido de um olhar sombrio e ameaçador. Cada choro, de
uma reprimenda. Depois, de golpes de bengala na cabeça, nas
clavículas, nos calcanhares. Com um golpe seco, ela sabia me fazer
gritar de dor. Eu soluçava, soluçava até sufocar. Os dias se
sucediam e eram iguais, naquela época. Eu continha a respiração.
Eu lançava meu espírito bem longe como um laço. De cansaço, caía
no meio da manhã e enfim adormecia. Os olhos da avó se fixavam nos
raros transeuntes cujos passos ela intuía muito antes de eles
chegarem até nós. Aqueles homens e mulheres não deixavam de
cumprimentar a matrona, que balançava a cabeça depois de cada
saudação.
O
passante: Como vai o pequeno?
Ela:
O Clemente vela por ele; hoje não temos do que nos queixar.
O
passante: E os seus velhos ossos?
Ela:
Se eles estalam é porque estão vivos.
O
passante: Pelos Anjos do Céu, a senhora vai enterrar a todos nós,
não é verdade?
Ela:
Pode contar com isso.
A
tigela de mingau que eu havia ignorado ficava de lado ainda por algum
tempo. Quinze minutos depois, fazia a felicidade de algum menininho
ou de alguma menininha da vizinhança. Por essa vez, a Avó,
solicitada por uns e outros, não me repreendia. Aproximadamente às
dez da manhã, a agitação no bairro mudava de patamar. Mamãe
chegava do mercado. Ela pegava um tamborete e se aproximava da velha
para lhe dar notícias de um parente convalescente, transmitir um
recado do imã do bairro ou se queixar do aumento do preço da carne.
Vovó a escutava. Nada parecia afetá-la.
Eu
não tinha direito a um só olhar de minha mãe. Encolhido aos pés
de Vovó Cochise, eu tremia de febre. Sentia rancor daquela mãe que
mantinha distância de meu pequeno corpo raquítico na esteira.
Tentava me acalmar para dar razão a minha avó e perturbar ainda
mais mamãe. Contemplava de um ponto de vista próprio os passantes
na rua. Tinha uma vista incrível de uma paisagem singular: as unhas
atrofiadas dos dedos dos pés de minha avó.
Eu
estava com 45 anos quando você entrou na minha vida, Béa. Filha do
desejo, você esperou o tempo necessário antes de vir ao mundo com
grande fanfarra.
Quando
criança, eu jamais havia tido animal de pelúcia, de palha ou de
papelão. Não era um bebê sadio, forte e bem nutrido como você.
Era magro e doentio. Para que eu parasse de chorar, só havia uma
solução. Minha mãe fez esta descoberta por um acaso
extraordinário. As grandes descobertas científicas, como a aspirina
ou a pasteurização, são filhas do acaso, sabe-se lá por quê. Uma
noite em que estava cansada de me ouvir gemer, minha mãe me imergiu
na água fria de uma bacia branca na varanda. Hoje revejo a cena com
certa emoção. Ao relatá-la, calafrios agitam meu corpo todo. As
lágrimas quase me vêm aos olhos.
Antes
de ser posto na bacia, eu havia tido a impressão de sufocar, a
garganta fechada. O que se seguia terminava sempre da mesma maneira:
eu tremia de frio, a água fresca amaciava minha pele. Se minha mãe
havia chegado a essa solução radical, é que ela recorrera a todos
os estratagemas possíveis sem conseguir acalmar o bebê chorão que
eu era. À noite, antes de me deitar na minha pequena esteira, ela me
contava toda sorte de histórias. Contos sobre meninos obedientes,
outros sobre animais dóceis ou plantas afetuosas. As histórias se
encadeavam. Nós éramos os dois únicos seres a se agitar enquanto
toda a cidade dormia à solta.
Quando
você nasceu, Béa, um detalhe me chamou a atenção: você tinha
orelhas grandes, um pouco como Barack Obama. Seu pequeno rosto era
marcado por seus grandes cílios. Você se mexia muito. Tremendo,
examinei seus membros. Graças a Deus você era saudável.
Sob
o efeito da dor, ainda meio inconsciente, sua mãe rompe enfim as
brumas que a envolviam para me perguntar o sexo do bebê.
Eu,
orgulhoso como um pavão: “É uma menina!”.
E
você gritou pela segunda vez.
Você
se esgoelava por qualquer motivo.
Fazia
questão de que sua mãe e eu comêssemos na palma da sua mão. Em
matéria de mistura explosiva, você é campeã em todas as
categorias. Ao sangue suíço-milanês de sua mãe, acrescente-se meu
sangue africano, que não é nada preguiçoso, porque todos os meus
antepassados eram nômades e, ainda hoje, eles continuam a ganhar de
todo mundo na corrida a pé.
Abdourahman A. Waberi, in Por que você dança quando anda?
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