Ao ouvir a palavra explodir,
madame Asari sentiu um frio na espinha; aquilo acionou uma memória
em sua mente de quando eles cruelmente tentaram assassinar o
professor no quarto da senhora Miruki e uma inesperada explosão
ocorreu, destruindo os corpos de ambos e espalhando os seus membros
para todo lado. — Bem, não temos escolha. Irei abrir esta sala
após acionar o sistema de segurança.
Com uma expressão desprovida de medo,
como se houvesse aceitado seu destino, Bara discou três números na
frente da porta. Três luzes-piloto piscaram em sucessão: verde,
vermelho, amarelo. Logo a porta começou a se abrir, silenciosa. O
temeroso grupo espiou o interior da sala, através da fresta
crescente.
— A nona sala é onde o professor
armazenou seus protótipos. Por favor, não encoste nas criaturas aí
dentro.
Bara os conduziu, e eles entraram na sala
com cuidado.
O grupo ficou abismado logo na primeira
coisa que notaram: de tudo o que podia haver ali, uma mulher nua —
inspecionando-lhes com os olhos — foi o que encontraram.
Ela aparentava ter cerca de 17 ou 18 anos
de idade, exibindo um lindo corpo de um branco puro e brilhante,
remetendo ao leite. Porém, acima de tudo, foi seu rosto encantador
que chamou a atenção deles; pode procurar pelo mundo inteiro e você
nunca verá uma mulher tão bonita. Algo nela era reminiscente da
Vênus de Milo, mas talvez fosse melhor dizer que ela mais se parecia
com um anjo. Sem sentir vergonha alguma por seu corpo (que de fato
não vestia nada), ela sorriu para o grupo.
— Que beleza incrível! — o
presidente Miruki disse em voz alta, sem vergonha, com uma alegria
lasciva. — Qual é o nome dela?
— O nome dado a ela é Annette —
respondeu Bara pela jovem mulher.
— Então o nome dela é Annette. Esse é
um bom nome, mas acredito que seria melhor dar a ela um nome
agradável, que faça jus à sua aparência.
— Mas, Vossa Excelência, você não
deve se confundir. Annette é um androide. Por favor, dê uma olhada
minuciosa em seu corpo.
— O quê? Olhar o corpo dela?
O presidente Miruki abriu bem os olhos e
analisou com calma o corpo de Annette.
— Ah, entendo.
Quando o presidente olhou para baixo, não
pôde deixar de sorrir, porque havia descoberto a parte do corpo dela
que estava incompleta, muito diferente de uma humana de verdade.
— Permita-me explicar. O que vocês
veem habitando esta sala são todas criaturas experimentais, criadas
pelo professor Kohak. Esse ser de quatro patas que parece com um
leitão tem o corpo e o coração artificial, e o cérebro foi
transplantado de um pastor alemão. Em seguida, temos um macaco com o
cérebro de uma criança humana…
De pé, em frente às jaulas de arame,
Bara descreveu as criaturas, uma a uma.
Era uma coleção de criaturas bizarras;
nenhuma era normal. Algumas pareciam humanas. Uma delas era a parte
de cima do corpo de um homem, imerso em um largo recipiente de vidro
preenchido com um líquido amarelo. Ele segurava um tubo de vidro em
sua boca com as duas mãos e bebia avidamente o líquido roxo que
saía dali. Seguindo o tubo até a sua origem, adjunto havia um
elaborado aparato químico, mas na entrada dele o líquido em seu
interior era amarelo. Em resumo, o ciclo foi desenvolvido para que o
líquido amarelo se transformasse no líquido roxo, e então de volta
para amarelo assim que passasse pelo meio-corpo. Bara explicou que
era um novo experimento focado em estudar ingestão nutricional.
Até mesmo durante as explicações de
Bara o presidente Miruki parecia ansioso, distraído pela androide
Annette. A secretária, madame Asari, não pôde ignorar o
comportamento dele, e por causa disso seu rosto ficou pálido e seu
corpo começou a tremer.
No entanto, o presidente Miruki não
pareceu notar a reação da madame e se separou do grupo, retornando
ao local em que Annette se encontrava.
— Adorável Annette, o que você está
fazendo aqui?
Annette deu um sorriso largo, assim como
uma mulher enlouquecida.
— Vossa Excelência — Bara abordou o
presidente com um olhar de preocupação. — Annette é um
protótipo, então ela só entende alguns códigos especiais. Ela não
entende a língua mirukiana.
— O quê? Ela não entende mirukiano?
Que infortúnio — o presidente disse. Porém a atração que ele
sentia por Annette apenas aumentou, sua beleza podia ser considerada
enlouquecedora.
Naquele momento, a secretária rangeu os
dentes, era visível o seu esforço para se conter, mas logo correu
na direção de Annette. O rosto da secretária estava pálido; ela
retirou uma faca de dentro de um bolso interno na parte superior de
sua roupa e, segurando-a como um picador de gelo, moveu seu braço
diretamente contra o coração de Annette. No entanto, no último
segundo, Bara pulou no braço de madame Asari, arriscando a própria
vida, e por pouco conseguiu proteger o androide. Contudo a secretária
estava em um frenesi; mesmo Bara podia sentir a adrenalina.
— Secretária, o que está fazendo?
— Isso não é da sua conta! Eu tenho
autoridade para matar esse androide, e vou!
— Por favor, não a mate.
— Por que você está interferindo?
Pode ser errado matar um ser humano, mas o que há de tão errado em
matar um androide? Só de olhar para essa mulher inútil me dá
vontade de vomitar. Com a minha autoridade, vou matar Annette.
— Não, você não deve matar Annette!
Desde que foi construída há várias semanas, ela tem protegido os
protótipos desta sala. Ela tem falado conosco e nós nos tornamos
amigas. Annette não é diferente de uma pessoa real. Matá-la é
apenas… absurdo!
Bara segurou firme o braço da
secretária, que tinha a faca em mãos e se recusava a soltar.
— Então você deseja se opor à
secretária de Estado. Como queira, você não será perdoada!
— Por favor, madame Asari, eu imploro
que reconsidere… E outra coisa, nós devemos proteger quem restou,
porque o professor se foi e talvez nunca mais sejamos capazes de
construir outros androides. Isso seria a pior perda possível para a
Nação Miruki!
— A pior perda possível? Que
presunçosa… — madame Asari soltou um riso abafado. — Eu
imagino que você tenha se apaixonado por esse androide.
Bara ficou em silêncio.
Em um surto de raiva, a secretária puxou
o cabelo de Bara e tentou arrastá-la para o chão. O presidente
Miruki, perplexo com isso, vociferou.
— Espere, madame Asari. Pelo nome de
Miruki, você está proibida de ferir esse androide! Os androides são
produtos preciosos da pesquisa de nossa nação. Ao longo dos anos,
gastei 80 bilhões de rukul nessa pesquisa. Você não pode matá-los.
Agora, abaixe essa faca.
— Vossa Excelência — madame Asari
disse, enquanto agarrava o colarinho do presidente. — Obedecerei à
sua ordem. No entanto, prometa-me uma coisa, você nunca irá falar
desses androides inúteis como se eles fossem pessoas reais, porque
não são.
— Sim, eu sei que não são. E você
sabe mais do que ninguém que não tenho motivos escusos aqui.
Com isso, os olhos da secretária se
estreitaram de repente e ela corou de vergonha.
No canto, Penn permaneceu sozinho,
enojado pelo que havia acontecido.
“Que situação perturbadora. Bara se
apaixonou pelo androide, e a secretária está tendo um caso com o
presidente Miruki. Com tudo isso acontecendo, não há mais motivos
para eu me segurar. Meu grande amigo Paul, o fabricante de sapatos,
alterou seu corpo para se tornar uma mulher, e com certeza ele fez
isso para poder ficar comigo. Certo, acho que está na hora de
acertar as coisas com Paul.”
Juza Unno, in A última transmissão
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