– Se abanque, no más – disse o
analista de Bagé, indicando o divã.
– Eu, ahn, prefiro ficar de pé –
disse o moço.
– Se abanque, índio velho, que tá incluído no preço.
– Não, obrigado…
–Deita aí! – disse o analista de
Bagé, empurrando o paciente, que caiu de costas no pelego.
O analista de Bagé sentou na sua
banqueta e começou a picar fumo para o palheiro. Como o moço não
dissesse nada, falou:
– E então? Desembucha.
– É que eu tenho um probleminha...
– Probleminha só pode ser o moleque
pequeno.
– “Moleque?”
– A peça. O trabuco. O Oduvaldo.
– Ah. Não, não é isso.
– Então o que é, tchê? Depressa que
eu to com a salinha cheia de louco.
– Bem, é que eu...
– O quê?
– Eu desde pequeno tenho este problema
de incontinência...
– Incontinência?
– Eu ainda faço xixi na cama...
Nisso o analista pulou e gritou:
– Meu pelego!
E levantou o divã por uma ponta,
despejando o paciente no chão.
Outra vez entrou um senhor no
consultório, deitou no divã e contou que ultimamente estava se
comportando de modo estranho.
– Me aposentei, doutor. E um dia, não
sei por quê, me deu vontade de pintar o cabelo de caju.
– Sei – disse o analista de Bagé,
sem tirar a bomba de chimarrão da boca.
– Comecei a usar roupas assim. Camisa
aberta até aqui embaixo...
– To ouvindo.
– Medalhão no peito...
– Pensei que fosse devoção.
– E me deu esta vontade de só andar
com rapazes...
– Sim.
– Me diga, doutor. Eu sou homossexual?
– Não existe gaúcho homossexual.
– Mas a gente vê tantos por aí...
– São as correntes migratórias. Tu
não tem nada, índio velho. Precisa é arranjar um passatempo.
Colecionar selo. Ou medalhão, pra não perder os que já tem. Vai
pra casa e sossega, tchê!
– Se eu fosse homossexual, nem sei o
que fazia. Acho que me jogava por essa janela!
Aí o analista de Bagé tapou a janela
com o corpo e ameaçou:
– Te fresqueia. Te fresqueia!
Luís Fernando Veríssimo, in O analista de Bagé
Nenhum comentário:
Postar um comentário