Este
conto é o melhor conto do livro. Mais do que isso. Esse conto é o
melhor conto do mundo. E isto, não fomos nós que decidimos. Isto
foi decidido unanimemente por dezenas de especialistas independentes
que o compararam – usando padrões laboratoriais rígidos – a uma
amostragem representativa da literatura mundial. Este conto é uma
inovação israelense exclusiva, única. E aposto que vocês estão
se perguntando, como foi que justamente nós (o pequeno e minúsculo
Israel) o escrevemos e não os norte-americanos? Então saibam que
também os norte-americanos fazem a mesma pergunta. E não são
poucos os figurões do mundo editorial norte-americano que estão
para perder o emprego por não terem tido uma resposta pronta a
tempo.
Exatamente
como o nosso exército é o melhor do mundo, este conto também.
Trata-se, inclusive, de uma inovação protegida por patente
registrada. E onde é que esta patente está registrada? É isso.
Está registrada no próprio conto. Neste conto não há tretas,
mumunhas ou partes melosas. É todo constituído de um único bloco,
uma amálgama de profundas introspecções e alumínio. Não
enferruja, não perturba, mas pode perambular. É muito atual, mas
também supratemporal. E a história julgará. Aliás, na opinião de
muitos e bons, já julgou e nosso conto triunfou.
“O
que é tão especial neste conto?” As pessoas perguntam por
ignorância ou dissimulação [depende de quem]. “O que é que ele
tem que não se encontre em Tchekov ou em Kafka ou sei lá quem?” A
resposta a esta pergunta é longa e complicada. Mais longa do que o
próprio conto, mas menos complexa. Porque não há algo mais
intrincado que este conto. Apesar disto, vamos tentar responder com
um exemplo. No final deste conto, em contraste com os contos de
Tchekov ou de Kafka, um afortunado vencedor – selecionado ao acaso
entre os que o leram corretamente – ganhará um carro Mazda Lantis
cor cinza metálico. E dentre os que lerem de forma incorreta será
sorteado outro carro, mais barato, mas não menos cinza metálico,
para que ele ou ela não se sinta mal. Porque este conto não está
aqui para mostrar arrogância. Ele está aqui para que vocês se
sintam bem. Como está escrito no guardanapo de papel da lanchonete
perto da casa de vocês? SE GOSTARAM, CONTEM PARA OS AMIGOS. SE NÃO
GOSTARAM, FALEM CONOSCO. Ou neste caso, contem ao conto. Porque este
conto não é só narrador, ele é também ouvinte. O ouvido dele,
como se diz, está atento aos sentimento do público. E quando o
público se encher dele e quiser lhe dar uma conclusão, este conto
não arrastará os pés ou se segurará nas bordas do altar, ele
simplesmente terá um fim.
Etgar Keret, in De repente, uma batida na porta
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