— Agora
você vai me contar uma história de amor — disse o rapaz à moça.
— Quero ouvir uma história de amor em que entrem caravelas, pedras
preciosas e satélites artificiais.
— Pois
não — respondeu a moça, que acabara de concluir o mestrado de
contador de histórias, e estava com a imaginação na ponta da
língua. — Era uma vez um país onde só havia água, eram águas e
mais águas, e o governo como tudo mais se fazia em embarcações
atracadas ou em movimento, conforme o tempo. Osmundo mantinha uma
grande indústria de barcos, mas não era feliz, porque Sertória,
objeto dos seus sonhos, se recusava a casar com ele. Osmundo
ofereceu-lhe um belo navio embandeirado, que ela recusou. Só
aceitaria uma frota de dez caravelas, para si e para seus familiares.
Ora,
ninguém sabia fazer caravelas, era um tipo de embarcação há muito
fora de uso. Osmundo apresentou um mau produto, que Sertória não
aceitou, enumerando os defeitos, a começar pelas velas latinas, que
de latinas não tinham um centavo. Osmundo, desesperado, pensou em
afogar-se, o que fez sem êxito, pois desceu no fundo das águas e lá
encontrou um cofre cheio de esmeraldas, topázios, rubis, diamantes e
o mais que você imagina. Voltou à tona para oferecê-lo à rígida
Sertória, que virou o rosto. Nada a fazer, pensou Osmundo; vou
transformar-me em satélite artificial. Mas os satélites artificiais
ainda não tinham sido inventados. Continuou humilde satélite de
Sertória, que ultimamente passeava de uma lancha para outra,
levando-o preso a um cordão de seda, com a inscrição “Amor
imortal”. Acabou.
— Mas
que significa isso? — perguntou o moço, insatisfeito. — Não
entendi nada.
— Nem
eu — respondeu a moça —, mas os contos devem ser contados, e não
entendidos; exatamente como a vida.
Carlos
Drummond de Andrade, in Contos plausíveis
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