domingo, 24 de novembro de 2019

Sete variações sobre um mesmo tema

I
Um macaco não pode fingir de homem porque é demasiadamente parecido com um homem.

II
Quando digo que a lua vem andando esguia como um lírio, estou muito mais próximo da verdade do que se a comparasse a uma foice, uma gôndola etc.

III
Um poema é uma Nau do Descobrimento.

IV
Quem lê um poema é como se de súbito ouvisse gritarem do topo do mastro: “Terra à vista! Terra à vista!”

V
Às vezes o gajeiro grita: “Homem ao mar!” Em vão: ninguém o pode salvar. Foi um leitor que caiu do poema como “a camélia que caiu do galho”... Ele, porém, foi cair (ou já estava) num banco de praça e não morreu nem nada, tanto assim que diz a seu vizinho, apontando-lhe estas linhas: “Esses poetas...” E ambos sacodem a cabeça, sacodem irresistivelmente as respectivas cabeças como bonecos de engonço.

VI
Ou serão mesmo bonecos de engonço?

VII
Mas uma rosa — num poema — é sempre a primeira rosa.
Mário Quintana, in Vaca e o hipogrifo

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