quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Hino à liberdade

Fora da liberdade, não sonhe ninguém a verdadeira prosperidade, material ou intelectual. Vós os que buscais na terra, amanhada com devoção, os tesouros, que vos oculta o seu seio inexaurível, não acrediteis que o trabalho possa medrar onde uns homens são servos de outros, onde a raça perde a sua virilidade no cativeiro, onde o torrão que se ara com amor se encrava nos desertos estéreis da escravidão. Vós os que vos tendes entregado às artes, às letras, às ciências, não esqueçais que de todas elas a mãe é a liberdade, e que sem esta o desenvolvimento daquelas é uma quimera fatal.
Do mundo antigo só não pereceram, para o cabedal estável do gênero humano, o cristianismo e a civilização grega, de que a romana é um longo reflexo. Mas o primeiro nos trouxe a liberdade no verbo divino da redenção pela justiça, pela tolerância, pela igualdade, e a segunda floresceu com a liberdade na eloquência, na filosofia, nas obras-primas da grande inspiração, nas supremas expressões humanas do belo.
Dezenas de séculos não lograram destruir a ânfora sagrada, que o gênio livre da Grécia inclinou à beira do mar Jônio; e é ainda ali que o pensamento busca hoje as suas origens, que os grandes renovadores da nossa cultura vão achar as fontes eternas, os modelos inimitáveis da transparência luminosa, da sinceridade e da natureza.
Rui Barbosa, in Antologia

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