Capítulo
139 - De Como Não Fui Ministro d'Estado
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Capítulo
140 - Que explica o anterior
Há
coisas que melhor se dizem calando; tal é a matéria do capítulo
anterior. Podem entendê-lo os ambiciosos malogrados. Se a paixão do
poder é a mais forte de todas, como alguns inculcam, imaginem o
desespero, a dor, o abatimento do dia em que perdi a cadeira da
Câmara dos Deputados. Iam-se-me as esperanças todas; terminava a
carreira política. E notem que o Quincas Borba, por induções
filosóficas que fez, achou que a minha ambição não era a paixão
verdadeira do poder, mas um capricho, um desejo de folgar. Na opinião
dele, este sentimento, não sendo mais profundo que o outro, amofina
muito mais, porque orça pelo amor que as mulheres têm às rendas e
toucados. Um Cromwell ou um Bonaparte, acrescentava ele, por isso
mesmo que os queima a paixão do poder, lá chegam à fina força ou
pela escada da direita, ou pela da esquerda. Não era assim o meu
sentimento; este, não tendo em si a mesma força, não tem a mesma
certeza do resultado; e dai a maior aflição, o maior desencanto, a
maior tristeza. O meu sentimento, segundo o Humanitismo...
– Vai
para o diabo com o teu Humanitismo, interrompi-o; estou farto de
filosofias que me não levam a coisa nenhuma.
A
dureza da interrupção, tratando-se de tamanho filósofo, equivalia
a um descaso; mas ele próprio desculpou a irritação com que lhe
falei. Trouxeram-nos café; era uma hora da tarde, estávamos na
minha sala de estudo, uma bela sala, que dava para o fundo da
chácara, bons livros, objetos d'arte, um Voltaire entre eles, um
Voltaire de bronze, que nessa ocasião parecia acentuar o risinho de
sarcasmo, com que me olhava, o ladrão; cadeiras excelentes; fora, o
sol, um grande sol, que o Quincas Borba, não sei se por chalaça ou
poesia, chamou um dos ministros da natureza; corria um vento fresco,
o céu estava nitidamente azul. De cada janela, – eram três –
pendia uma gaiola com pássaros, que chilreavam as suas óperas
rústicas. Tudo tinha a aparência de uma conspiração das coisas
contra o homem; e, conquanto eu estivesse na minha sala, olhando para
a minha chácara, sentado na minha cadeira, ouvindo meus pássaros ao
pé dos meus livros, alumiado pelo meu sol, não chegava a curar-me
das saudades daquela outra cadeira, que não era minha.
Machado
de Assis, in Memórias póstumas de Brás Cubas
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