Nunca
podia imaginar que fosse tão agradável a função de contar
histórias, para a qual fui nomeado por decreto do rei. A nomeação
colheu-me de surpresa, pois jamais exercitara dotes de imaginação,
e até me exprimo com certa dificuldade verbal. Mas bastou que o rei
confiasse em mim para que as histórias me jorrassem da boca à
maneira de água corrente. Nem carecia inventá-las. Inventavam-se a
si mesmas.
Este
prazer durou seis meses. Um dia, a rainha foi falar ao rei que eu
estava exagerando. Contava tantas histórias que não havia tempo
para apreciá-las, e mesmo para ouvi-las. O rei, que julgava minha
facúndia uma qualidade, passou a considerá-la defeito, e ordenou
que eu só contasse meia história por dia, e descansasse aos
domingos. Fiquei triste, pois não sabia inventar meia história.
Minha insuficiência desagradou, e fui substituído por um mudo, que
narra por meio de sinais, e arranca os maiores aplausos.
Carlos
Drummond de Andrade, in Contos plausíveis
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