domingo, 25 de agosto de 2019

A morte do escriba

Da escolha exclui a parte,
molda-se o escriba:
sua pele, sua carne
sua margem, sua saliva

e todo tijolo é medido,
a argamassa, pesada,
como se embala o filho
como se constrói a casa

o trabalho findado,
morre com ele o escriba,
renasce então o lastro:
o homem e sua lida;

em tudo comum essa vida
a imagem é o mundo,
o homem que se aproxima
como todo homem, em tudo,

sem maior saber exato
que não o ofício aprendido
sem nenhum poder inato
ou inspiração ou espírito

e se não há saber concreto
e a divisão do pouco
só resulta desafeto,
não há saber no morto,

é apenas mais um corpo
de arquitetura igual
sem potência se solto
onipotente se multidão;

e quando inicia a escrita
no papel renascido
então o escriba respira
silente, sem aplauso, sozinho,

e se corpo, cala o indivíduo,
fala como fala o coletivo,
se escriba, fala o escrito,
fala como morto e redivivo.
Yuri Pires

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