O
amor da humanidade, quando nasce do sofrimento, é como a sabedoria
vinda do infortúnio. Nos dois casos, as raízes são podres e a
fonte contaminada. Só um amor espontâneo proveniente de uma
abnegação sincera e de um elan irresistível pode fecundar a
alma dos outros. O amor que vem do sofrimento traz lágrimas e
suspiros demais para que seus raios não sejam banhados por uma
amarga claridade. Ele contém tanta renúncia, tormento e inquietude
que não pode significar outra coisa que não um imenso retiro. Ele
perdoa tudo, admite tudo e tudo justifica; é isto ainda amor? Como
pode amar aquele que se sente desvinculado de tudo? Este tipo de amor
revela o vazio de uma alma pega entre o nada e o tudo, da mesma forma
que, para um coração quebrado, o donjuanismo permanece o único
recurso. Quanto ao cristianismo, ele ignora o amor: ele conhece
apenas a indulgência, que é mais uma alusão ao amor do que amor
propriamente dito.
Emil
Cioran, in Nos cumes do desespero
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