Fomos
para a grande aleia do jardim público onde passeiam os moradores da
cidade. Examinamos muitas duplas de moças que passavam por nós ou
estavam sentadas nos bancos, mas elas não nos agradaram muito.
Apesar
disso, Martin abordou duas com as quais entabulou conversa, marcando
até encontro, mas eu sabia que não era para valer. É aquilo que
chamo abordagem de treinamento; exercício a que ele se dedica
de vez em quando para não perder a prática.
Contrariados,
saímos do jardim público e fomos para as ruas, mergulhadas no vazio
e no tédio de pequena cidade provinciana.
— Venha
beber alguma coisa — disse a Martin. — Estou com sede.
Encontramos
um prédio em cuja fachada estava escrito: “Café”. Entramos, mas
havia apenas um self-service; a sala era azulejada, fria e
pouco acolhedora; fomos até o balcão, onde havia uma senhora
desagradável, para comprar um refrigerante, que em seguida levamos
para uma mesa manchada de molho que deveria nos incitar a sair dali o
mais depressa possível.
— Não
ligue — disse Martin —, a feiura tem em nosso mundo uma função
positiva. Ninguém quer perder seu tempo; assim que chegamos a um
lugar, temos pressa de ir embora: isso dá à vida o ritmo desejado.
Mas não vamos nos deixar envolver. Podemos conversar uma porção de
coisas protegidos pela feiura tranquila deste café.
Tomou
uma soda e me perguntou: — Você já abordou sua estudante de
medicina?
— Claro
que sim — respondi.
— E
como é ela? Descreva-a direito.
Descrevi
a estudante de medicina, o que não me deu trabalho, se bem que a
estudante de medicina não existisse. É. Isso com certeza me deixa
mal, mas é assim. Eu a inventei.
Podem
acreditar na minha palavra: não agi por motivos escusos, para
brilhar diante de Martin ou para iludi-lo. Inventei essa estudante de
medicina pela simples razão de que não podia mais suportar a
insistência de Martin.
Martin
é extremamente exigente no que diz respeito à minha atividade. Está
convencido de que a cada dia encontro uma mulher nova. Ele me vê
diferente do que sou e se lhe dissesse francamente que durante uma
semana inteira não possuí novas mulheres, nem mesmo me aproximei
delas, ele me tomaria por hipócrita.
Eu
me vi, portanto, constrangido a contar-lhe alguns dias antes que
tinha feito um cerco a uma estudante de medicina. Ele pareceu
satisfeito e me estimulou a passar à abordagem. Naquele dia
certificou-se dos meus progressos.
— Ela
é do tipo de quem?
É
do tipo de...? Fechou os olhos, procurando na penumbra um termo de
comparação... Depois lembrou-se de uma amiga comum: — É do tipo
de Sílvia?
— É
muito melhor — respondi.
Martin
espantou-se:
— Você
está brincando...
— É
do tipo da sua Georgina.
Sua
própria mulher é para Martin o critério supremo. Martin ficou
muito satisfeito com meu relato e se entregou ao devaneio.
Milan
Kundera, in Risíveis Amores
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