A
vida perigosa. Tive que levantar às oito horas para dar comida para
os gatos porque o cara da Segurança Westec vinha às oito e meia
para começar a instalar um sistema mais sofisticado de alarme. (Era
eu o cara que costumava dormir em cima de latas de lixo?)
A
Segurança Westec chegou exatamente às oito e meia. Um bom sinal.
Levei-o ao redor da casa mostrando janelas, portas etc. Bom, bom.
Colocaríamos fios nelas, instalaríamos detectores para quebra de
vidros, sensores baixos, sensores cruzados, aspersores para incêndio
etc. Linda desceu e fez algumas perguntas. Ela é melhor nisso do que
eu.
Me
veio um pensamento: “Quanto tempo isso vai demorar?”.
“Três
dias”, ele disse.
“Jesus
Cristo”, disse eu. (Dois desses dias o hipódromo estaria fechado.)
Assim,
demos um tempo e o deixamos lá. Dissemos que já voltaríamos.
Tínhamos um cheque-presente de US$ 100 no I. Magnin’s que alguém
tinha nos dado de presente de casamento. Eu também tinha que
depositar um cheque de direitos autorais. Assim, ao banco. Assinei o
cheque.
“Eu
gostei muito da sua assinatura”, disse a garota.
Outra
garota veio e olhou a assinatura.
“A
assinatura dele muda a toda hora”, disse Linda.
“É
que eu fico assinando meu nome nos livros”, eu disse.
“Ele
é um escritor”, disse Linda.
“É
mesmo? O que você escreve?”, perguntou uma das garotas.
“Diz
pra ela”, falei para Linda.
“Ele
escreve poemas, contos e novelas”, ela disse.
“E
fiz um filme”, disse eu.
“Barfly.”
“Ah”,
disse uma das garotas. “Eu vi.”
“Você
gostou”?
“Gostei”,
ela sorriu.
“Muito
obrigado”, falei.
Nos
viramos e saímos.
“Ouvi
uma das garotas dizer, quando entramos: ‘Sei quem é aquele cara’
”, disse Linda.
Viu?
Somos famosos. Entramos no carro e fomos até o shopping center para
comer alguma coisa perto do I. Magnin’s.
Pegamos
uma mesa, comemos sanduíche de peru e tomamos suco de maçã e
capucinos. Da mesa, podia-se ver uma grande parte do shopping. O
lugar estava virtualmente vazio. Os negócios não iam bem. Bem,
tínhamos um cupom de cem dólares para gastar. Ajudaríamos a
economia.
Eu
era o único homem lá. Só havia mulheres nas mesas, sozinhas ou aos
pares. Os homens estavam em outro lugar. Não me importei. Me sentia
seguro com as mulheres. Estava descansando. Minhas feridas estavam
cicatrizando. Podia aguentar um pouco de sombra. Imagine se eu
pudesse pular abismos para sempre. Talvez depois de um descanso eu
pudesse me jogar outra vez da beirada. Talvez.
Terminamos
de comer e fomos ao I. Magnin’s.
Eu
precisava de camisas. Olhei as camisas. Não achei uma puta camisa.
Parecia que tinham sido desenhadas para idiotas. Desisti. Linda
precisava de uma bolsa. Encontrou uma, com desconto de 50%. Era US$
395. Só que não parecia ser de US$ 395. Mais como $ 49,50.
Desistiu. Havia duas cadeiras com cabeças de elefante no encosto.
Legais. Mas custavam milhões. Havia um pássaro de vidro bonito, US$
75, mas Linda disse que não tínhamos onde colocá-lo. A mesma coisa
com o peixe de listras azuis. Estava ficando cansado. Olhar as coisas
me deixou cansado. As lojas de departamentos me fadigam e deprimem.
Não há nada nelas. Toneladas e toneladas de merda. Mesmo que fosse
de graça, eu não levaria nada. Será que eles nunca vendem nada
legal?
Decidimos
que talvez um outro dia. Fomos à livraria. Eu precisava de um livro
sobre o meu computador. Precisava saber mais. Encontrei um livro. Fui
até um vendedor. Ele fez a nota. Paguei com cartão. “Muito
obrigado”, disse ele. “Poderia fazer a gentileza de assinar
isso?” Ele me alcançou meu último livro. Bem, eu era famoso. Me
reconheceram duas vezes no mesmo dia. Duas vezes era o suficiente.
Três vezes ou mais e você teria problemas. Os deuses estavam
fazendo tudo na medida pra mim. Perguntei seu nome, escrevi-o no
livro, escrevinhei alguma coisa, meu nome e um desenho.
Paramos
na loja de computadores no caminho de casa. Precisava de papel para a
impressora a laser. Eles não tinham. Fiz uma banana para o vendedor.
Me fez pensar nos velhos tempos. Ele me recomendou um lugar.
Encontramos no caminho de casa. Encontramos tudo lá, com desconto.
Comprei papel laser para os próximos dois anos e também envelopes
para correspondência, canetas, clipes de papel. Agora, tudo o que eu
tinha a fazer era escrever.
Chegamos
em casa. O homem da segurança já tinha ido. O cara do telhado tinha
vindo e ido embora. Deixou um bilhete: “Voltarei às quatro da
tarde”. Sabíamos que o cara do telhado não ia voltar às quatro.
Era maluco. Uma infância ruim. Muito confuso. Mas bom com as telhas.
Levei
as coisas para cima. Eu estava pronto. Eu era famoso. Eu era um
escritor.
Sentei
e liguei o computador. Abri os JOGOS IDIOTAS. Daí, comecei a jogar
Tao. Estava ficando cada vez melhor nisso. Raramente perdia
para o computador. Era mais fácil que apostar em cavalos, mas, de
certa forma, não me satisfazia tanto. Bom, voltarei na quarta-feira.
Apostar nos cavalos aperta os meus parafusos. É parte do esquema.
Funciona. E eu tinha 5.000 folhas de papel para encher.
Charles
Bukowski, in O capitão para o almoço e os marinheiros
tomaram conta do navio
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