III
Se
os zelotes eram poderosos na política local, os partidários do
ensino independente também eram poderosos em todas as principais
faculdades e universidades do país. Em defesa de Russell, acorreram
diversos reitores de faculdades, incluindo Gideonse, de Brooklyn;
Hutchins, de Chicago (onde Russell lecionara no ano anterior);
Graham, da Carolina do Norte, que posteriormente veio a ser senador
dos EUA; Neilson, da Smith University; Alexander, de Antioch; e
Sproule, da Universidade da Califórnia, onde Russell estava, na
época, “doutrinando os alunos em suas regras libertárias
relativas à vida licenciosa em questões de sexo e amor promíscuo”.
Em defesa de Russell também acorreram presidentes e ex-presidentes
sociedades letradas – Nicholson, da Phi Beta Kappa; Curry, da
Associação Matemática Norte-Americana; Hankies, da Associação
Sociológica Norte-Americana; Beard, da Associação Histórica
Norte-Americana; Ducasse, da Associação Filosófica
Norte-Americana; Himstead, da Associação Norte-Americana de
Professores Universitários, e vários outros. Dezessete dos mais
destacados eruditos do país (incluindo Becker, de Cornell; Lovejoy,
da Johns Hopkins; e Cannon, Kemble, Perry e Schlesinger, de Harvard)
enviaram uma carta ao prefeito LaGuardia protestando contra o “ataque
organizado à nomeação do filósofo mundialmente renomado Bertrand
Russell (...)”. Se tal ataque se comprovasse bem-sucedido,
prosseguia a carta, “nenhuma faculdade ou universidade
norte-americana estaria a salvo do controle inquisitório por parte
dos inimigos do pensamento livre (...). Receber instrução de um
homem do calibre intelectual de Bertrand Russell é um raro
privilégio para estudantes de qualquer lugar (...). Seus críticos
deveriam enfrentá-lo no campo aberto e justo da discussão
intelectual e da análise científica. Eles não têm o direito de
silenciá-lo impedindo-o de lecionar (...). A questão é tão
fundamental que não pode ser resolvida sem ameaçar toda a estrutura
da liberdade intelectual sobre a qual a vida universitária
norte-americana repousa”. Whitehead, Dewey, Shapley, Kasner,
Einstein – todos os principais filósofos e cientistas defenderam
abertamente a nomeação de Russell. “Grandes espíritos”,
Einstein observou, “sempre encontraram forte oposição por parte
das mediocridades. Estas não conseguem entender quando um homem
conscientemente não se submete a preconceitos hereditários, mas usa
sua inteligência de maneira honesta e corajosa.”
O
apoio a Russell não se limitou, de maneira alguma, à comunidade
acadêmica. A nomeação de Russell e a independência da autoridade
que fez a indicação foram, é claro, endossadas pela União de
Liberdades Civis dos Estados Unidos e pelo Comitê de Liberdade
Cultural, cujo presidente, na época, era Sidney Hook. Também
tomaram o partido de Russell todos os porta-vozes dos grupos
religiosos mais liberais, incluindo o rabino Jonah B. Wise; o
professor J.S. Bixler, da Faculdade de Teologia de Harvard; o
professor E.S. Brightman, diretor do Conselho Nacional de Religião e
Educação; o reverendo Robert G. Andrus, conselheiro dos alunos
protestantes da Universidade de Columbia; o reverendo Jonh Haynes
Holmes e o reverendo Guy Emery Shipley, que questionaram o direito de
o bispo Manning falar em nome da Igreja Episcopal. Nove editores de
destaque – incluindo Bennet Cerf, da Random House; Cass Canfield,
da Harper’s; Alfred A. Knopf e Donald Brace, da Harcourt Brace –
publicaram uma declaração exaltando a escolha de Russell como “algo
que apenas reflete o mais alto crédito do Conselho de Educação
Superior”. Falando a respeito das “brilhantes conquistas em
filosofia” de Russell e de suas “grandes qualidades como
educador”, os editores declararam que seria “uma pena para os
alunos da cidade de Nova York não se beneficiarem dessa nomeação”.
Como editores, prosseguiam, “não concordamos necessariamente, de
maneira pessoal, com todas as opiniões expressas pelos autores dos
livros que publicamos, mas acolhemos grandes pensadores em nossas
listas, especialmente neste momento, em que a força bruta e a
ignorância ganharam tanta ascendência sobre a razão e o intelecto
em tantas partes do mundo. Pensamos ser mais importante do que nunca
honrar a superioridade intelectual sempre que essa oportunidade se
apresenta”. Sentimentos similares foram expressos pelos jornais
Publishers’ Weekly e New York Herald Tribune, tanto
em seus editoriais como por Dorothy Thompson, em sua coluna “On the
Record”. “Lorde Russell não é imoral”, ela escreveu.
“Qualquer pessoa que o conheça tem ciência de que é um homem da
mais distinta integridade intelectual e pessoal.”
Na
própria Faculdade Municipal havia muito ressentimento, igualmente
entre estudantes e professores, em relação à da interferência
eclesiástica e política nos assuntos internos da faculdade. Em um
encontro geral realizado no grande salão, o professor Morris Raphael
Cohen comparou a situação de Russell à de Sócrates. Se a nomeação
de Russell fosse revogada, ele disse, “o bom nome de nossa cidade
sofrerá, assim como sofreu Atenas ao condenar Sócrates como
corruptor da juventude, ou Tennessee, ao considerar Scopes culpado
por ensinar a teoria da evolução”. No mesmo encontro, o professor
Herman Randall Jr., distinto historiador da filosofia e ele próprio
um homem religioso, denunciou a oposição dos homens da Igreja à
nomeação de Russell como uma “afronta pura” e uma
“impertinência grotesca”. Trezentos membros da Faculdade
Municipal assinaram uma carta felicitando o Conselho de Educação
Superior pela esplêndida nomeação. Os pais dos alunos da Faculdade
Municipal também não se alarmaram ante a perspectiva de que seus
filhos fossem expostos à influência corrosiva da “mente superior
por trás do amor livre”. Apesar de a maior parte dos opositores de
Russell desfilar como porta-voz dos “pais ofendidos”, a
Associação de Pais da Faculdade Municipal votou unanimemente a
favor da ação do Conselho.
Paul
Edwards, in Apêndice de Por que não sou cristão, de
Bertrand Russell
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