Existem
experiências às quais não podemos sobreviver. Experiências que
nos fazem enxergar que nada mais tem sentido. Após terem atingido os
limites da vida, terem vivido com exasperação todo o potencial
destes perigosos confins, os atos e gestos cotidianos perdem todo o
charme, toda a sedução. Se continuamos a viver apesar disso, assim
acontece devido às Escrituras, que aliviam esta tensão sem limites.
A criação preserva-se apenas temporariamente das garras da morte.
Sinto-me
a ponto de explodir com tudo o que me oferecem a vida e a perspectiva
da morte. Sinto-me morrer de solidão, de amor, de ódio e de todas
as coisas deste mundo. Tudo isto parece fazer de mim um balão
prestes a estourar. Nestes momentos extremos, realizo uma conversão
ao Nada. Dilato-me interiormente até a loucura, para além de todas
as fronteiras, à margem da luz, quando esta já foi extirpada da
noite, em direção ao excesso em que um turbilhão selvagem
projeta-me direto ao nada. A vida cria uma plenitude e o nada,
exuberância e depressão; o que somos diante da vertigem que nos
consome até o absurdo? Eu sinto a vida estalar em mim sob o excesso
tanto da intensidade, quanto do desequilíbrio - uma explosão
indomável capaz de fazer saltar irremediavelmente o indivíduo. Nas
extremidades da vida, sentimos que esta nos escapa; que a
subjetividade é mera ilusão; e que em nós mesmos fervem forças
incontroláveis, arruinando todo o ritmo definido. O que, então, não
nos concede uma razão para morrer? Morremos tanto de tudo o que é,
quanto de tudo o que não é. Toda a experiência torna-se,
imediatamente, um salto no nada. Mesmo sem tê-la conhecido inteira,
uma mera prova é o suficiente. Assim que começamos a morrer de
solidão, de desespero ou de amor, as outras emoções somente
prolongam este sombrio cortejo. A sensação de não poder mais viver
após tais vertigens resulta igualmente de uma consumação interior.
As chamas da vida ardem num forno de onde o calor não escapa. Estes
que vivem sem preocupação com o essencial são salvos desde o
início; mas o que eles têm a salvar, eles que não conhecem o menor
dos perigos? O paroxismo das sensações, o excesso da interioridade
porta-nos a uma direção eminentemente perigosa, já que uma
existência que toma consciência demais das suas raízes pode apenas
negar-se a si mesma. A vida é limitada demais, fragmentada demais,
para resistir às grandes tensões. Todos os místicos não tiveram,
após suas epifanias, o sentimento de não poder mais viver? O que
podem, então, esperar deste mundo aqueles que sentem além da
normalidade, da vida, da solidão, do desespero e da morte?
Emil
Cioran, in Nos cumes do desespero
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