Nada
saberia justificar o fato de viver. Podemos de fato, tendo partido ao
limite de nós mesmos, invocar argumentos, causas, efeitos ou
considerações morais? Certamente não: resta-nos para viver,
portanto, apenas razões despidas de fundamento. No apogeu do
desespero, somente a paixão do absurdo impede ainda a explosão de
um caos demoníaco. Quando todos os ideais correntes, sejam eles de
ordem moral, estética, religiosa, social ou outra, não chegam a
imprimir à vida uma direção e finalidade, como preservá-la ainda
do nada? Nisso, nós apenas podemos chegar agarrando-se ao absurdo e
à inutilidade absoluta, a este nada profundamente insípido, mas
cuja ficção é a mesma de criar a ilusão da vida.
Eu
rio porque as montanhas não sabem rir, nem os vermes da terra
cantar. A paixão do absurdo nasce somente no indivíduo em que
tudo foi purgado, a este que é mais suscetível de submeter-se a
temíveis transfigurações futuras. A quem tudo perdeu só resta
esta paixão. Que charmes poderiam, à partir de então, seduzi-lo?
Certas pessoas não deixarão de responder: o sacrifício em nome da
humanidade ou do bem público, o culto do belo, etc. Eu amo apenas
estes homens que chegaram a provar, ainda que provisoriamente, tudo
isto. Eles são os únicos a ter vivido de maneira absoluta, os
únicos habilitados a falar da vida. Se podemos reencontrar amor e
serenidade, é através do heroísmo, não da inconsciência. Toda a
existência que não contém uma grande loucura permanece despida de
valor. Em que ponto uma tal existência se distinguiria da de uma
pedra, de um pedaço de madeira ou de uma erva-daninha? Eu afirmo-o
com toda a honestidade, devemos ser portadores de uma grande loucura
para que queiramos nos tornar em pedra, pedaço de madeira ou
erva-daninha.
Emil
Cioran, in Nos cumes do desespero
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