quarta-feira, 25 de julho de 2018

Volta, Susana!

O Sucuri continuou aparecendo:
Agora estamos com Carranza.
Está bem.
Agora estamos com o general Obregón.
Está bem.
Agora selaram a paz. Estamos soltos.
Espere. Não desarme o seu pessoal. Isso pode não durar muito.
O padre Rentería alçou-se em armas. Vamos com ele, ou contra ele?
Não tem nem o que discutir. Você que se ponha do lado do governo.
Mas é que somos irregulares. No governo nos consideram rebeldes.
Então, vá descansar.
Acelerado do jeito que estou?
Então faça o que quiser.
Pois vou dar apoio ao padre. Gosto do jeito que eles gritam. Além do mais, a gente leva de pingo a salvação da alma.
Faça o que quiser.

Pedro Páramo estava sentado numa velha cadeira de couro, ao lado da porta grande da Media Luna, pouco antes que se fosse a última sombra da noite. Estava sozinho, fazia talvez umas três horas. Não dormia. Tinha se esquecido do sono e do tempo: “Nós velhos dormimos pouco, quase nunca. Às vezes só cochilamos; mas sem deixar de pensar. Essa é a única coisa que me resta fazer.” Depois acrescentou em voz alta: “Não demora. Já não vai demorar.”
E continuou: “Faz muito tempo que você foi-se embora, Susana. A luz então era igual à de agora, não tão vermelha; mas era a mesma pobre luz sem lume, envolta no pano branco da neblina que existe agora. Era o mesmo momento. Eu aqui, ao lado da porta olhando o amanhecer e olhando quando você ia embora, seguindo o caminho do céu; por onde o céu começava a se abrir em luzes, afastando-se, cada vez mais descolorida entre as sombras da terra.
Foi a última vez que vi você. Passou roçando com seu corpo os galhos de um jasmineiro que está na vereda e levou com o seu ar as últimas folhas. Depois, você desapareceu. Eu disse: ‘Volta, Susana!’”
Pedro Páramo continuou movendo os lábios, sussurrando palavras. Depois fechou a boca e entreabriu os olhos, onde a débil claridade do amanhecer refletiu.
Amanhecia.
Juan Rulfo, in Pedro Páramo

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