sexta-feira, 8 de junho de 2018

Uma revolução permanente

A Revolução Industrial abriu novos caminhos para converter energia e produzir bens; com isso, em grande medida, libertou a humanidade de sua dependência do ecossistema à sua volta. Os humanos derrubaram florestas, drenaram pântanos, represaram rios, inundaram planícies, construíram dezenas de milhares de quilômetros de ferrovias e edificaram metrópoles repletas de arranha-céus. Enquanto o mundo era moldado para atender às necessidades do Homo sapiens, habitats foram destruídos e espécies foram extintas. Nosso planeta, um dia verde e azul, está se tornando um shopping center de plástico e concreto.
Hoje, os continentes da Terra abrigam quase 7 bilhões de sapiens. Se pegássemos todas essas pessoas e as colocássemos em uma balança gigante, sua massa combinada seria cerca de 300 milhões de toneladas. Se, então, pegássemos todos os animais de criação domesticados – vacas, porcos, ovelhas e frangos – e os colocássemos em uma balança ainda maior, sua massa seria cerca de 700 milhões de toneladas. Já a massa combinada de todos os grandes animais selvagens que sobreviveram – de porcos-espinhos e pinguins a elefantes e baleias – é menos de 100 milhões de toneladas. Nossos livros infantis, nossa iconografia e nossas telas de TV estão cheios de girafas, lobos e chimpanzés, mas o mundo real tem pouquíssimos deles. Há em torno de 80 mil girafas no mundo, em comparação com 1,5 bilhão de cabeças de gado; somente 200 mil lobos, comparados com 400 milhões de cachorros domesticados; apenas 250 mil chimpanzés – em contraste com bilhões de humanos. A humanidade realmente dominou o mundo.
Degradação ecológica não é o mesmo que escassez de recursos. Como vimos no capítulo anterior, os recursos disponíveis para a humanidade estão crescendo constantemente e é bem provável que continuem a crescer. É por isso que as profecias apocalípticas de escassez de recursos provavelmente são equivocadas. Já o temor à degradação ecológica tem sua razão de ser. O futuro talvez testemunhe os sapiens tomando o controle de uma cornucópia de novos materiais e fontes de energia, enquanto simultaneamente destrói o que resta do habitat natural e leva a maior parte das outras espécies à extinção.
De fato, a desordem ecológica pode ameaçar a sobrevivência do próprio Homo sapiens. O aquecimento global, o aumento do nível dos oceanos e a poluição disseminada podem tornar a Terra menos habitável para nossa própria espécie, e o futuro, consequentemente, pode testemunhar uma disputa cada vez maior entre a capacidade humana e desastres naturais induzidos pelo homem. À medida que os humanos usam sua capacidade para conter as forças da natureza e submeter o ecossistema a suas necessidades e seus caprichos, podem causar cada vez mais efeitos colaterais imprevistos e perigosos. É provável que estes só possam ser controlados por meio de manipulações ainda mais drásticas do ecossistema, o que resultaria em caos ainda maior.
Muitos chamam esse processo de “destruição da natureza”. Mas, na verdade, não é destruição, é transformação. A natureza não pode ser destruída. Há 65 milhões de anos, um asteroide exterminou os dinossauros, mas ao fazer isso abriu caminho para os mamíferos. Hoje, a humanidade está levando muitas espécies à extinção e pode inclusive aniquilar a si mesma. Mas outros organismos estão se saindo muito bem. Ratos e baratas, por exemplo, estão em seu apogeu. Essas criaturas obstinadas provavelmente sairiam de baixo dos escombros fumacentos de um armagedom nuclear prontas para espalhar seu DNA. Talvez daqui a 65 milhões de anos, ratos inteligentes olhem para trás e sintam-se gratos pela dizimação causada pela humanidade, assim como hoje podemos agradecer àquele asteroide que destruiu os dinossauros.
Ainda assim, os rumores sobre nossa própria extinção são prematuros. Desde a Revolução Industrial, a população humana mundial tem florescido como nunca. Em 1700, o mundo abrigava cerca de 700 milhões de humanos. Em 1800, éramos 950 milhões. Em 1900, havíamos quase dobrado para 1,6 bilhão. E, em 2000, esse número quadruplicou para 6 bilhões. Hoje, falta pouco para chegarmos aos 7 bilhões de sapiens.
Yuval Noah Harari, in Sapiens: uma breve história da humanidade

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