Alma não come pão.
Alma come beleza. O pão engorda, faz o corpo ficar pesado. A beleza,
ao contrário, faz a gente ficar cada vez mais leve. Não é raro que
os comedores de beleza se tornem criaturas aladas e desapareçam no
azul do céu, onde moram os deuses, os anjos e os pássaros. A beleza
é coisa da leveza.
Há dois tipos de
beleza.
O primeiro é a
beleza que os deuses oferecem aos homens como dádiva. Ela cai dos
céus, à semelhança do maná. A segunda é a beleza que os homens
oferecem aos deuses como dádiva. Ela sobe da terra aos céus, como
fumaça ou bolhas de sabão.
Conhece-se a beleza
dádiva dos deuses por aquilo que ela produz na alma dos homens. Quem
é possuído por ela entra em êxtase: cessa o riso, cessa o choro, o
pensamento para, a fala emudece. É mística. A alma está tomada
pela felicidade da tranquilidade absoluta. Era assim que se sentia o
Criador ao contemplar, ao final de cada dia de trabalho, o resultado
da sua obra: “Está muito bom! Do jeito como deveria ser! Nada há
a ser modificado! Amém!”.
Rubem Alves,
in
Pimentas: para
provocar um incêndio, não é preciso fogo
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