quarta-feira, 6 de junho de 2018

Sobre a Beleza

Alma não come pão. Alma come beleza. O pão engorda, faz o corpo ficar pesado. A beleza, ao contrário, faz a gente ficar cada vez mais leve. Não é raro que os comedores de beleza se tornem criaturas aladas e desapareçam no azul do céu, onde moram os deuses, os anjos e os pássaros. A beleza é coisa da leveza.
Há dois tipos de beleza.
O primeiro é a beleza que os deuses oferecem aos homens como dádiva. Ela cai dos céus, à semelhança do maná. A segunda é a beleza que os homens oferecem aos deuses como dádiva. Ela sobe da terra aos céus, como fumaça ou bolhas de sabão.
Conhece-se a beleza dádiva dos deuses por aquilo que ela produz na alma dos homens. Quem é possuído por ela entra em êxtase: cessa o riso, cessa o choro, o pensamento para, a fala emudece. É mística. A alma está tomada pela felicidade da tranquilidade absoluta. Era assim que se sentia o Criador ao contemplar, ao final de cada dia de trabalho, o resultado da sua obra: “Está muito bom! Do jeito como deveria ser! Nada há a ser modificado! Amém!”.
Rubem Alves, in Pimentas: para provocar um incêndio, não é preciso fogo

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