A religião se
baseia, acredito, em primeiro lugar e principalmente, no medo.
Trata-se, em parte, do terror ao desconhecido e, em parte, como eu já
disse, do desejo de sentir a existência de um tipo de irmão mais
velho a proteger-nos em todos os problemas e disputas. O medo é a
base de todo o problema: medo do misterioso, medo da derrota, medo da
morte. O medo é o progenitor da crueldade, e portanto não é nada
surpreendente o fato de a crueldade e a religião andarem lado a
lado. Isso acontece porque o medo é a base de ambas as coisas. Neste
mundo, agora podemos começar a compreender um pouco as coisas e a
controlá-las com a ajuda da ciência, que abriu seu caminho à
força, passo a passo, contra a religião cristã, contra as igrejas
e contra a oposição de todos os preceitos antigos. A ciência pode
nos ajudar a superar esse medo covarde no qual a humanidade vive há
tantas gerações. A ciência pode nos ensinar, e acredito que também
nosso próprio coração pode fazê-lo, a não mais olhar em volta em
busca de apoios imaginários, a não mais inventar aliados no céu,
mas, em vez disso, a olhar para os nossos próprios esforços aqui
embaixo, a fim de fazer deste mundo um lugar adequado para se viver,
em vez do tipo de lugar em que as igrejas ao longo desses séculos
todos o transformaram.
O QUE DEVEMOS FAZER
Queremos nos erguer
sobre os próprios pés e olhar com justeza e honestidade para o
mundo: seus aspectos bons, seus aspectos maus, suas belezas, suas
feiuras; ver o mundo como ele é e não ter medo dele; conquistar o
mundo com a inteligência, e não simplesmente subjugados como
escravos pelo terror que emana dele. Toda a concepção de Deus é
uma concepção que deriva dos antigos despotismos orientais.
Trata-se de uma concepção bastante indigna dos homens livres.
Quando ouvimos pessoas na igreja se rebaixando e dizendo que são
pecadoras miseráveis e tudo o mais, isso me parece algo desprezível
e indigno de seres humanos que respeitem a si mesmos. É necessário
nos erguermos e olhar para o mundo com franqueza, de frente.
Precisamos fazer com que o mundo seja o melhor possível – e, se
ele não for tão bom como gostaríamos que fosse, no final das
contas ainda será melhor do que aquilo que todos esses outros
fizeram dele ao longo de tantas eras. Um mundo bom precisa de
conhecimento, gentileza e coragem; não precisa de anseios pesarosos
em pelo passado nem do agrilhoamento do livre pensar a palavras
proferidas há muito tempo por homens ignorantes. Precisa de
perspectivas desprovidas de medo e de liberdade para a inteligência.
Precisa de esperança para o futuro, e não de retrocesso a um
passado que já morreu, que, acreditamos, será enormemente superado
pelo futuro que a nossa inteligência é capaz de criar.
Bertrand
Russell, in Por que não sou cristão
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