Leitor amigo: Bom
dia. Bom dia, boa tarde ou boa noite? Não o posso dizer ao certo,
porque não me é dado adivinhar a que horas volverás os olhos para
este meu escrito tão cheio de senões como de banalidades... Mas, ao
pegares nesta folha, consulta o teu relógio e, de acordo com o seu
mostrador, aceita os meus cumprimentos...
Meu bom leitor:
abro hoje esta seção fazendo-te um pedido e uma promessa: quando,
aos domingos, à hora em que tranquilamente te sentares à tua mesa,
onde fumega, saboroso e escuro, o habitual café das “sete”, eu
te levar, pelo Índio, as minhas frases insulsas e tolas,
peço-te que volvas a memória para o passado remoto e sigas o
edificante exemplo de Jó, o expoente máximo que foi da paciência
humana.
Quero com isso
dizer-te que deves ser paciente e caridoso comigo e que, por eu ficar
impingindo-te todos os domingos uma injeção desta, não me deves
ficar querendo mal.
Mas eu lembrei-te
Jó. E muitíssimo mais do que isto ele sofreu, sem uma palavra de
ironia ou um gesto de vingança. Também eu te prometo que nem
mandarei matar os teus filhos nem saquearei os teus haveres... E tudo
isto e mais ainda sofreu o pobre homem da Bíblia...
Não ficamos bem
assim?
Tu fazendo-me o
pedido e eu cumprindo a minha promessa?
De resto, quem sabe
se esta seção não te irá fazer algum bem... Sofres de insônia,
meu paciente leitor? Então não usarás melhor narcótico! Talvez
nem seja preciso ler a garrancheira toda, para o sono chegar-te.
Estive no meio de uma gente, que, para dormir, não era preciso mais
que a minha presença! Ora, se a presença de uma criatura é bom
narcótico, claro está que o que ela escreve o será ainda melhor.
Pois não concordas? Manda a boa lógica que se pense assim. Bem, o
teu café já deve estar esfriando, e para não maçar-te mais, faço
ponto, antes que de tua boca saia esta expressão tão em moda agora
na nossa pacata Palmeira: “Que bucha!”
Graciliano
Ramos, in O Índio, Palmeira dos Índios, ano 1, nº 1, 30
de janeiro de 1921
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