sexta-feira, 27 de abril de 2018

Um bastardo muito rico

ele era um bastardo muito rico num banho a vapor, chorando. tinha todas as gravações de J. S. Bach e ainda assim não estava adiantando nada. possuía vitrais nas janelas da sua casa mais uma foto de uma freira mijando. ainda assim: nada. certa vez teve um motorista de táxi assassinado com a lua cheia no Deserto de Nevada enquanto observava. aquilo passou em 30 minutos. amarrava cães em cruzes e queimava os seus olhos com charutos. coisa antiga. tinha fodido tantas mulheres jovens e finas e de pernas douradas que isso já não era mais bom.
nada.
tinha cheiros exóticos queimando enquanto se banhava, jogava bebidas na cara do criado.
um bastardo rico, uma pasta insidiosa era o que ele era. um verme e velho e realmente repugnante. um cuspe no culhão das rosas.
ele continuava chorando ali em cima da mesa enquanto eu fumava um dos seus charutos.
me ajude, oh JESUS, me ajude!”, gritava.
já era tempo. “espere um minuto”, disse a ele.
fui até o armário e apanhei o cinto e então ele curvou-se sobre a mesa, toda aquela massa branca e informe, aquele cu nojento e cabeludo, e eu girei e castiguei com força a fivela do cinto em cima dele repetidas vezes:
ZAP! ZAP!
ZAP! ZAP! ZAP!
caiu da mesa como um siri atrás de água. rastejou pelo chão e eu o segui com a fivela.
ZAP!
ZAP!
ZAP!
enquanto ele gritava de novo duas ou três vezes mais eu me inclinei para baixo e queimei ele com o charuto. aí então ele se prostrou, sorrindo. caminhei até a cozinha, onde seu advogado sentava tomando café.
terminou?”
hã hãn.”
ele tirou cinco de dez, jogou-as ao longo da mesa. servi-me de café e sentei. o charuto ainda estava na minha mão. joguei ele na pia.
jesus”, disse eu, “Jesus Cristo.”
é”, disse o advogado, “o último cara durou apenas um mês.” ficamos ali bebericando o café. era uma bela cozinha.
volte na próxima quarta-feira”, disse.
por que que você não faz isso por mim?”, perguntei.
EU? eu sou muito sensível!”
nós dois rimos e eu coloquei cubos de açúcar no café.
Charles Bukowski Lispector, in Notas de um velho safado

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