Aquele
que não foi amado é o que mais ama. É o menino que nunca beijou,
distraído nos pelos loiros do pescoço da colega.
É
a menina que tem uma única dúvida: até quando devo estender a
língua em outra boca? Sem pais, sem professores, sem amigos para
perguntar uma coisa dessas.
É
o jovem de topete, fingindo que não é virgem no recreio, mas que
ainda dorme com o travesseiro entre as pernas.
É
a jovem ruiva que se excita andando de bicicleta e engolindo vento.
É
o velho na janela que somente conheceu putas.
É
a velha vizinha dele que gostaria de ter sido puta.
Os
tímidos, os feios, os recalcados, os lindos, os arredios, os brabos;
fico pensando em quem silencia suas vontades para não incomodar e
têm o silêncio cheio de tremores.
Aquele
que ama sem ser amado é o que mais ama.
É
a secretária louca pelo seu chefe e que passará a vida anotando
recados da esposa dele (há o que confessa a verdade pelo ciúme, e o
que guarda toda a verdade na inveja).
É
o adolescente que reza para o ônibus encher e assim poder esbarrar
na moça de colar de pérola (há o que consegue puxar conversa, há
o que espera ser empurrado).
É
o professor que teve uma única namorada e desvia o olhar dos casais
se abraçando nas praças (há o que levanta a cabeça com orgulho,
há o que baixa de tanto que deseja).
É
a faxineira que cuida do vestido da patroa, prende no cabide e não
se aguenta: coloca a peça sobre os seios rapidamente temendo que
alguém entre (há o que exibe seu corpo, há o que se encolhe para
receber outro corpo).
É
a casada que anseia jantar uma noite fora para usar de novo o par de
brincos do casamento. É o homem que não faz a barba para esconder
as acnes e as marcas da adolescência.
Ai,
como dói quem espera amar. Quem dedica uma vida à disciplina da
paciência, torcendo para o sexo melhorar o casamento, torcendo para
o casamento melhorar o sexo, torcendo para que o marido não fique
bêbado ao menos uma vez, torcendo para que a esposa não reclame ao
menos uma vez, dormindo e esquecendo a tristeza, acordando e repondo
a esperança, aqueles que resistem e talvez envelheçam sem completar
seus sonhos, que respeitam as pequenas alegrias porque podem ser as
únicas, que não decidiram se diminuem a expectativa para sair da
solidão ou aumentam as exigências para justificá-la.
Como
eu amo quem se importa em amar, apesar de tudo. Apesar de tudo.
Fabrício
Carpinejar, in Ai meu Deus, ai meu Jesus
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