Uma
importante variedade do prazer e, com isso, fonte da moralidade,
provém do hábito. O usual faz-se mais facilmente, melhor, portanto,
com mais agrado, sente-se nisso um prazer e sabe-se, por experiência,
que o habitual deu bom resultado, daí é útil; um costume, com o
qual se pode viver, está provado que é salutar, proveitoso, ao
contrário de todas as tentativas novas, ainda não comprovadas. O
costume é, por conseguinte, a união do agradável e do útil; além
disso, não exige reflexão. Assim que o homem pode exercer coação,
exerce-a para impor e introduzir os seus costumes, pois para ele,
eles são a comprovada sabedoria prática. De igual modo, uma
comunidade de indivíduos obriga cada um deles ao mesmo costume.
Aqui
está a conclusão errada: porque uma pessoa se sente bem com um
costume ou, pelo menos, porque por intermédio do mesmo assegura a
sua existência, então esse costume é necessário, pois passa por
ser a única possibilidade de uma pessoa se conseguir sentir bem; o
agrado da vida parece emanar exclusivamente dele. Esta concepção do
habitual como uma condição da existência é aplicada até aos mais
pequenos pormenores do costume: dado que o conhecimento da verdadeira
causalidade é muito escasso entre os povos e as civilizações que
se encontram a um nível baixo, vela-se, pois, com supersticioso
receio, por que tudo continue a seguir com o mesmo andamento; mesmo
quando o costume é difícil, austero, incômodo, é conservado,
devido à sua utilidade aparentemente superior. Não se sabe que o
mesmo grau de bem-estar também pode existir com outros costumes e
que até é possível alcançar graus mais elevados. Mas aquilo que
se percebe bem é que todos os costumes, até os mais austeros, com o
tempo se tornam mais agradáveis e suaves e que até o modo de vida
mais severo se pode tornar um hábito e, portanto, um prazer.
Friedrich
Nietzsche, in Humano, demasiado humano
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