Em
frente ao cemitério, Estaminet, Letreiro esquisito, — diz consigo
o nosso passeador, — mas próprio para despertar a sede!
Certamente, o dono desse cabaré sabe apreciar Horácio e os poetas
discípulos de Epicuro. Talvez mesmo conheça o refinamento profundo
dos antigos egípcios, que não admitiam banquete sem esqueleto, ou
outro símbolo qualquer da brevidade da vida.
Entrou,
bebeu uma garrafa de cerveja diante dos túmulos e fumou
vagarosamente um charuto. Depois, teve a extravagância de ir até ao
cemitério, onde o mato era alto e convidativo, e onde reinava um
riquíssimo sol.
A
luz e o calor eram causticantes. Dir-se-ia que o sol embriagado
espojava-se todo sobre um tapete de flores magníficas fertilizadas
pela destruição. Um imenso burburinho de vida, — a vida dos
infinitamente pequenos, — enchia o espaço cortado a intervalos
regulares pela crepitação dos disparos de um tiro vizinho, que
ressoavam como o espocar das garrafas de champagne no gorjeio de uma
sinfonia em surdina.
Então,
sob o sol que lhe esquentava o cérebro e na atmosfera dos ardentes
perfumes da Morte, ouviu uma voz cochichar debaixo do túmulo em que
se sentara. Essa voz dizia: — Malditos sejam vossos alvos e vossas
carabinas, oh vivos turbulentos, que tão pouco vos importais com os
defuntos e o seu divino repouso! Malditas sejam as vossas ambições,
malditos os vossos planos, oh mortais impacientes, que vindes
aprender a arte de matar junto ao santuário da Morte! Se soubésseis
como é fácil ganhar o prêmio, como é fácil alcançar o fim, e
como tudo é nada, exceto a Morte, não vos fatigaríeis tanto, oh
laboriosos viventes, e perturbaríeis menos o sono dos que há tanto
tempo puseram no Fim o único fim verdadeiro da detestável vida!
Charles
Baudelaire, in Pequenos poemas em prosa
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