Tem
que ser benévola, porque se fosse aguda, isso talvez me fizesse
nunca mais escrever. E eu quero escrever, algum dia talvez. Embora
sentindo que se voltar a escrever, será de um modo diferente do meu
antigo: diferente em quê? Não me interessa.
Minha
autocrítica a certas coisas que escrevo, por exemplo, não importa
no caso se boas ou más: mas falta a elas chegar àquele ponto em que
a dor se mistura à profunda alegria e a alegria chega a ser dolorosa
– pois esse ponto é o aguilhão da vida.
E
tantas vezes não consegui o encontro máximo de um ser consigo
mesmo, quando com espanto dizemos: “Ah!” Às vezes esse encontro
comigo mesmo se consegue através do encontro de um ser com outro
ser.
Não,
eu não teria vergonha de dizer tão claramente que quero o máximo –
e o máximo deve ser atingido e dito com a matemática perfeição da
música ouvida e transposta para o profundo arrebatamento que
sentimos. Não transposta, pois é a mesma coisa. Deve, eu sei que
deve, haver um modo em mim de chegar a isso.
Clarice
Lispector, in A descoberta do mundo
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