Todo
caso de amor tem sempre um grande e um pequeno.
Alguém
um dia falou, em francês, que em todo caso de amor il y a
toujours celui qui aime et celui qui se laisse aimer. É mais ou
menos a mesma coisa. O pequeno ama, o grande se deixa amar. O grande
fala, o pequeno ouve. O grande discorda, o pequeno concorda. O
pequeno teme, o grande ameaça. O grande se atrasa, o pequeno se
antecipa. O grande pede, ou nem precisa pedir, e o pequeno já está
fazendo.
Não
é uma questão de gênero. Existem homens pequenos e homens grandes,
mulheres grandes e mulheres pequenas. O temperamento e as
circunstâncias influem, mas não determinam. O grande pode ser o
mais bem-sucedido dos dois ou não. O pequeno pode ser o mais
sensível, mas nem sempre é assim. Muitas vezes o grande é o mais
esperto, mas existem pequenos espertíssimos. Depende do caso.
Como
ninguém descobriu, até hoje, uma regra que permita determinar qual
é o grande e qual é o pequeno, só observando o casal mais
atentamente.
Na
rua, o que anda distraído quase sempre é o grande.
Quase
sempre, no cinema, o grande só decide comprar pipoca depois que os
dois já estão acomodados nas poltronas. pequeno, então, fica
esperando, vigiando, tomando conta para o filme não começar antes
de o grande voltar, o que, por algum motivo, seria uma tragédia.
Numa
festa, o pequeno deve estar ansioso para que a noite seja boa,
principalmente se foi ele que sugeriu o programa. O grande se
comportará de maneira indiferente até se deixar embriagar pela
música, pela bebida ou pelo ambiente, quando então ficará muito
mais animado do que o pequeno. Mesmo que o pequeno dance bem, o
grande sempre dançará melhor. O pequeno evita o silêncio porque
tem certeza de que a culpa é dele, por isso sempre tem arquivados na
cabeça assuntos que possam ser úteis em todas as ocasiões. A calça
nova do pequeno dificilmente lhe cai tão bem quanto a do grande,
assim como o cabelo do grande está sempre melhor do que o pequeno,
ainda que a festa inteira pense exatamente o contrário. O pequeno
geralmente se comove com a Lua calado, enquanto o grande aponta, olha
só a Lua. No final da festa é sempre o pequeno que quer ir embora,
reservando o melhor da sua alegria para o resto da noite, enquanto o
grande se despede dos amigos displicentemente.
Mais
tarde, o pequeno é macho, é gueixa, é desgraçado, é exclusivo e,
se o coração do grande por acaso ouvir seus gritos, que sorte. No
dia seguinte o pequeno estará inevitavelmente preocupado: será que
eu fiz tudo certo? Acho que eu não devia ter dito aquilo. Por que
toda vez sou eu que beijo primeiro? Na dúvida, vai correndo procurar
o grande, apesar de ter se prometido que nunca mais faria isso.
O
grande e o pequeno podem ser de qualquer espécie, inclusive bichos,
com exceção dos gatos, que são todos grandes.
Não
necessariamente formam um casal. Não é só nas histórias de amor
que existem grandes e pequenos. Havendo mais de um, um par qualquer,
dois adversários, dois irmãos, dois amigos, sempre haverá o que
quer mais e o que quer menos, o fascinante e o fascinado, o generoso
e o pedinte.
Mas
como tudo pode acontecer, senão nada disso ia ter graça, a qualquer
momento, por alguma razão, geralmente à noite, imprevisivelmente, o
grande pode ficar pequeno, e o pequeno ficar grande de repente. Basta
um vacilo, um acaso, um cair de tarde, um olhar mais assim, um
furacão, uma inspiração, uma imprudência.
Quando
isso acontece, é comum o pequeno ficar maior ainda, o que torna
automaticamente o grande ainda menor. O ex-pequeno, logo que é
promovido a grande, pode se vingar do ex-grande, se o seu sofrimento
tiver boa memória. Aí, coitado do novo pequeno, vai se arrepender
de cada não beijo, cada não telefonema, cada não noite de insônia,
cada não desespero, cada não entusiasmo, cada não carinho
inesperado, indispensável, inevitável, imprescindível, cada não
todas as palavras apaixonadas em qualquer língua do mundo. Ele vai
se surpreender com a reviravolta, no começo, pipoca depois que os
dois já estão acomodados nas poltronas. pequeno, então, fica
esperando, vigiando, tomando conta para o filme não começar antes
de o grande voltar, o que, por algum motivo, seria uma tragédia.
Numa
festa, o pequeno deve estar ansioso para que a noite seja boa,
principalmente se foi ele que sugeriu o programa. O grande se
comportará de maneira indiferente até se deixar embriagar pela
música, pela bebida ou pelo ambiente, quando então ficará muito
mais animado do que o pequeno. Mesmo que o pequeno dance bem, o
grande sempre dançará melhor. O pequeno evita o silêncio porque
tem certeza de que a culpa é dele, por isso sempre tem arquivados na
cabeça assuntos que possam ser úteis em todas as ocasiões. A calça
nova do pequeno dificilmente lhe cai tão bem quanto a do grande,
assim como o cabelo do grande está sempre melhor do que o pequeno,
ainda que a festa inteira pense exatamente o contrário. O pequeno
geralmente se comove com a Lua calado, enquanto o grande aponta, olha
só a Lua. No final da festa é sempre o pequeno que quer ir embora,
reservando o melhor da sua alegria para o resto da noite, enquanto o
grande se despede dos amigos displicentemente.
Mais
tarde, o pequeno é macho, é gueixa, é desgraçado, é exclusivo e,
se o coração do grande por acaso ouvir seus gritos, que sorte. No
dia seguinte o pequeno estará inevitavelmente preocupado: será que
eu fiz tudo certo? Acho que eu não devia ter dito aquilo. Por que
toda vez sou eu que beijo primeiro? Na dúvida, vai correndo procurar
o grande, apesar de ter se prometido que nunca mais faria isso.
O
grande e o pequeno podem ser de qualquer espécie, inclusive bichos,
com exceção dos gatos, que são todos grandes.
Não
necessariamente formam um casal. Não é só nas histórias de amor
que existem grandes e pequenos. Havendo mais de um, um par qualquer,
dois adversários, dois irmãos, dois amigos, sempre haverá o que
quer mais e o que quer menos, o fascinante e o fascinado, o generoso
e o pedinte.
Mas
como tudo pode acontecer, senão nada disso ia ter graça, a qualquer
momento, por alguma razão, geralmente à noite, imprevisivelmente, o
grande pode ficar pequeno, e o pequeno ficar grande de repente. Basta
um vacilo, um acaso, um cair de tarde, um olhar mais assim, um
furacão, uma inspiração, uma imprudência.
Quando
isso acontece, é comum o pequeno ficar maior ainda, o que torna
automaticamente o grande ainda menor. O ex-pequeno, logo que é
promovido a grande, pode se vingar do ex-grande, se o seu sofrimento
tiver boa memória. Aí, coitado do novo pequeno, vai se arrepender
de cada não beijo, cada não telefonema, cada não noite de insônia,
cada não desespero, cada não entusiasmo, cada não carinho
inesperado, indispensável, inevitável, imprescindível, cada não
todas as palavras apaixonadas em qualquer língua do mundo. Ele vai
se surpreender com a reviravolta, no começo, mas vai se conformar
com sua nova condição de pequeno em seguida. E então vai seguir,
cuidadoso e desastrado, na quase inútil intenção de conquistar o
grande urgentemente.
Adriana
Falcão, in O doido da garrafa
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