Charlotte Gilman em uma manifestação
O
que aconteceria se uma mulher despertasse uma manhã transformada em
homem? E se a família não fosse o campo de treinamento onde o
menino aprende a mandar e a menina a obedecer? E se houvesse creches?
E se o marido participasse da limpeza e da cozinha? E se a inocência
se fizesse dignidade? E se a razão e a emoção andassem de braços
dados? E se os pregadores e os jornais dissessem a verdade? E se
ninguém fosse propriedade de ninguém?
Charlotte
Gilman delira. A imprensa norte-americana a ataca, chamando-a de mãe
desnaturada, e mais ferozmente a atacam os fantasmas que moram em sua
alma e a mordem por dentro. São eles os temíveis inimigos que
Charlotte contém, quem às vezes conseguem derrubá-la. Mas ela cai
e se levanta, e cai e novamente se levanta, e torna a se lançar pelo
caminho. Esta tenaz caminhadora viaja sem descanso pelos Estados
Unidos, e por escrito e por falado vai anunciando, nos começos do
século vinte, um mundo ao contrário.
Eduardo
Galeano, in Mulheres
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