Diadorim
estava me esperando. Ele tinha lavado minha roupa: duas camisas e um
paletó e uma calça, e outra camisa, nova, de bulgariana. As vezes
eu lavava a roupa, nossa; mas quase mais quem fazia isso era
Diadorim. Porque eu achava tal serviço o pior de todos, e também
Diadorim praticava com mais jeito, mão melhor. Ele não indagou
donde eu tinha estado, e eu menti que só tinha entrado lá por causa
da velha Ana Duzuza, a fim de requerer o significado do meu futuro.
Diadorim também disso não disse; ele gostava de silêncios. Se ele
estava com as mangas arregaçadas, eu olhava para os braços dele ―
tão bonitos braços alvos, em bem feitos, e a cara e as mãos
avermelhadas e empoladas, de picadas das mutucas. No momento, foi que
eu caí em mim, que podia ter perguntado à Ana Duzuza alguma
passagem de minha sina por vir. Também uma coisa, de minha, fechada,
eu devia de perguntar. Coisa que nem eu comigo não estudava, não
tinha a coragem. E se a Duzuza adivinhasse mesmo, conhecesse por
detrás o pano do destino? Não perguntei, não tinha perguntado.
Quem sabe, podia ser, eu estava enfeitiçado? Me arrependi de não
ter pedido o resumo à Ana Duzuza. Ah, tem uma repetição, que
sempre outras vezes em minha vida acontece. Eu atravesso as coisas ―
e no meio da travessia não vejo! ― só estava era entretido na
ideia dos lugares de saída e de chegada. Assaz o senhor sabe: a
gente quer passar um rio a nado, e passa; mas vai dar na outra banda
é num ponto muito mais em baixo, bem diverso do em que primeiro se
pensou. Viver nem não é muito perigoso?
Guimarães
Rosa, in Grande sertão: veredas
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