QUINTA-FEIRA
19 – Li os ensaios morais de Tolstói e me contorci e lutei com a
conclusão de que a moralidade, o conceito moral, é uma forma de
melancolia. Não para mim, não para mim! O comportamento moral, sim,
mas sem qualquer conceito. Há uma senilidade lúgubre na moralidade
que é destituída de vida real. Vamos apenas dizer – a essência
das coisas é boa, sua forma também é boa até que ela é
exaurida, e assim, então, sendo má, inútil, gasta, a substância
se vai e deixa ali a forma vazia. Tudo muito geral. Concluí que a
sabedoria de Dostoiévski é a mais alta sabedoria do mundo, porque
não é apenas a sabedoria de Cristo, mas um Cristo Karamazov de
alegria e luxúria. Vamos ter uma moral que não exclua a vida
simples – amar! Pobre Tolstói, angustiado por ter iniciado rico e
libertino – mas quando um conde se retira para junto dos
camponeses, isso é de alguma importância para o mundo
(trocadilho intencional). Tolstói devia ser acanhado em relação à
sua importância moral aos olhos do mundo. Mas Dostoiévski,
Shakespeare – a moralidade deles cresce na terra, está ali
escondida e se reproduzindo. Dostoiévski nunca precisou se
retirar para a moralidade, ele sempre foi a moralidade, e tudo o mais
também.
Jack
Kerouac, in Diários de Jack Kerouac (1947-1954)
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