terça-feira, 10 de maio de 2016

Vendedores de carro

Nas cidades, nos subúrbios das cidades, nos campos, nos terrenos baldios, nos depósitos de ferro-velho e de carros usados, nas oficinas, ostentam-se os cartazes: “Automóveis usados, quase novos. Transporte barato. Três trailers Ford 1927 em perfeito estado. Carros garantidos, carros reformados. Rádios de graça. Autos com cem litros de gasolina grátis. Agradecemos a visita. Carros usados. Sem despesas suplementares.”
Um pequeno espaço de terra e uma casinha suficientemente grande para conter uma secretária, uma cadeira e um livro de capa azul. Um maço de contratos, de papéis dobrados e amarrotados nas pontas, seguro por um grampo de aço, e uma pilha de formulários para contratos, ainda em branco. Caneta — a caneta deve ser conservada sempre cheia, sempre pronta para trabalhar. Já perdemos negócios por causa de uma caneta sem tinta.
Esses filhos da puta ali não compram, com certeza. Todo mundo os conhece. Não fazem mais que olhar. Passam a vida toda olhando. Não comprarão carros, nem se pense nisso. O que eles querem é desperdiçar o tempo dos outros. Ali, aqueles dois... não, os que estão com as crianças. Ponha eles num carro. Começa pedindo duzentos e vai baixando depois. Eles têm cara de quem paga 125. Insista com eles. Dê umas voltas. Obrigue-os a comprar. Só estão aqui pra desperdiçar o nosso tempo.
Os donos, com as mangas arregaçadas. Vendedores bem-arrumados, de olhos implacáveis, fixos, esperando um momento de fraqueza do comprador. Olha só a cara da mulher. Se ela gostar, o velhote compra. Mostre-lhe esse Cadillac. Depois poderá levá-los nesse Buick 1926. Se começar com um Buick, eles vão querer um Ford. Arregace as mangas, e vamos ao trabalho. Isso não vai levar muito tempo. Mostre-lhes esse Nash, enquanto eu vou tapar o rombo daquele Dodge 1925. Quando estiver pronto, vou lhe dar um sinal.
O que o senhor quer é um carro pra viajar, né? Pois não, não precisa ser um carro de luxo. Sim, o estofamento está um pouco surrado, mas não são as poltronas que fazem o carro rodar.
Carros enfileirados, com os focinhos apontados para a frente, focinhos enferrujados, pneus encolhidos, gastos. Em filas bem unidas.
Quer ver este? Pois não. Vamos tirá-lo da fila.
Faça-o compreender que está tomando seu tempo. Faça com que ele se sinta na obrigação moral de comprar. As pessoas, em geral, têm sentimentos. Não gostam de prejudicar ninguém. Faça com que elas sintam que estão lhe dando prejuízo, tomando o seu tempo. Depois, entra um calhambeque pela goela deles.
John Steinbeck, in As vinhas da ira

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