-
Meu filho, aquele seu amigo, o Jorge, telefonou.
-
O que é que ele queria?
-
Convidou você para dormir na casa dele, amanhã.
-
E o que é que você disse?
-
Disse que não sabia, mas que achava que você iria aceitar o
convite.
-
Fez mal, mamãe. Você sabe que odeio dormir fora de casa.
-
Mas meu filho, o Jorge gosta tanto de você…
-
Eu sei que ele gosta de mim. Mas eu não sou obrigado a dormir na
casa dele por causa disso, sou?
-
Claro que não. Mas…
-
Mas o que, mamãe?
-
Bem, quem decide é você. Mas, que seria bom você dormir lá,
seria.
-
Ah, é? E por quê?
-
Bem, em primeiro lugar, o Jorge tem um quarto novo de hóspedes e
queria estrear com você. Ele disse que é um quarto muito lindo. Tem
até tevê a cabo.
-
Eu não gosto de tevê.
-
O Jorge também disse que queria lhe mostrar uns desenhos que ele
fez...
- Não estou interessado nos desenhos do Jorge.
- Não estou interessado nos desenhos do Jorge.
-
Bom. Mas tem mais uma coisa…
-
O que é, mamãe?
-
O Jorge tem uma irmã, você sabe. E a irmã do Jorge gosta muito de
você. Ela mandou dizer que espera você lá.
-
Não quero nada com a irmã do Jorge. É uma chata.
-
Você vai fazer uma desfeita para a coitada…
-
Não me importa. Assim ela aprende a não ser metida. De mais a mais
você sabe que eu gosto da minha cama, do meu quarto. E, depois,
teria de fazer uma maleta com pijama, essas coisas…
-
Eu faço a maleta para você, meu filho. Eu arrumo suas coisas
direitinho, você vai ver.
-
Não, mamãe. Não insista, por favor. Você está me atormentando
com isso. Bem, deixe eu lhe lembrar uma coisa, para terminar com essa
discussão: amanhã eu não vou a lugar nenhum. Sabe por que, mamãe?
Amanhã é meu aniversário. Você esqueceu?
-
Esqueci mesmo. Desculpe, filho.
-
Pois é. Amanhã estou fazendo 50 anos. E acho que quem faz 50 anos
tem o direito de passar a noite em casa com sua mãe, não é
verdade?
Moacyr
Scliar, crônica
publicada no jornal Folha de S. Paulo, em 03/09/2001
Nenhum comentário:
Postar um comentário