“Naquele
homem cético, moderado e taciturno, havia uma paixão verdadeira,
exclusiva e ardente: era a filha. Camargo adorava Eugênia: era sua
religião. Concentrava esforços e pensamentos em fazê-la feliz, e
para o alcançar não duvidaria empregar, se necessário fosse, a
violência, a perfídia e a dissimulação. Nem antes nem depois
sentira igual sentimento; não amou a mulher; casou porque o
matrimônio é uma condição de gravidade. O maior amigo que teve
foi o Conselheiro Vale; mas essa mesma amizade que o ligara ao pai de
Estácio, nunca recebera a contraprova do sacrifício; aliás
apareceria em toda a sinceridade a natureza do médico. Ele só
conhecia os afetos, por assim dizer, caseiros e inertes, os que não
sabem nem podem afrontar as intempéries da vida. Nas relações
morais dos homens possuía somente o troco miúdo da polidez; a moeda
de ouro dos grandes afetos nunca lhe entrara nas arcas do coração.
Um só existia ali: o amor de Eugênia.”
Machado
de Assis, in Helena
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