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— Sou
Eduviges Dyada. Entre, senhor.
Era
como se estivesse à minha espera. Tinha tudo pronto, pelo que me
disse, fazendo que eu a seguisse por uma longa série de quartos
escuros, que pareciam desolados. Mas não; porque assim que me
acostumei ao escuro e ao delgado fio de luz que nos seguia, vi
crescerem sombras em ambos os lados e senti que íamos caminhando
através de um corredor estreito aberto entre vultos.
— O
que é que tem aqui? — perguntei.
—
Trastes velhos — me disse ela. —
Estou com a casa toda entrastada. Fui escolhida para guardar os
móveis dos que foram embora, e ninguém regressou atrás deles. Mas
o quarto que reservei para o senhor fica nos fundos. Deixo esse
quarto sempre vazio, para o caso de chegar alguém. E quer dizer
então que o senhor é filho dela?
— Ela
quem?
—
Doloritas.
— Sou,
mas como é que a senhora sabe?
— Ela
me avisou que o senhor viria. E justamente hoje. Que chegaria hoje.
— Quem
avisou? Minha mãe?
— Sim.
Ela.
E
eu não soube o que pensar. Nem ela me deixou pensar:
— Este
aqui é o seu quarto.
Não
tinha portas, somente aquela pela qual havíamos entrado. Ela acendeu
a vela e eu vi o vazio.
— Aqui
não tem onde deitar.
— Não
se preocupe com isso. O senhor deve estar cansado e o sono é um
colchão muito bom para o cansaço. Amanhã eu arrumo a sua cama.
Como o senhor sabe, não é fácil ajeitar tudo num dois-por-três.
Para isso é preciso andar prevenido, e sua mãe só me avisou agora.
— Minha
mãe — eu disse –, minha mãe já morreu.
— Com
razão a voz dela estava tão fraca, como se tivesse precisado
atravessar uma distância muito grande até chegar aqui. Agora eu
entendo. E morreu faz quanto tempo?
— Já
faz sete dias.
—
Coitada dela. Deve ter-se sentido
abandonada. Fizemos a promessa de morrer juntas. De irmos embora nós
duas, para dar ânimo uma à outra durante a viagem, se fosse
preciso, se por acaso encontrássemos alguma dificuldade. Éramos
muito amigas. Ela nunca falou de mim para o senhor?
— Não,
nunca.
— Acho
estranho. Claro que naquela época éramos menininhas. E ela era
recém-casada. Mas nós duas gostávamos muito uma da outra. Sua mãe
era tão bonita, tão, digamos, tão doce, que dava gosto gostar
dela. Dava vontade de gostar dela. Quer dizer então que ela foi-se
embora na frente, não é mesmo? Mas tenha certeza de que vou
alcançá-la. Só eu entendo como o céu está longe de nós; mas sei
como encurtar as veredas. Tudo consiste em morrer, graças a Deus,
quando a gente quiser e não quando Ele dispuser. Ou, se você
preferir, forçá-lo a querer antes da hora. Perdoe chamar o senhor
de você; se faço isso é porque o considero como filho. Sim, muitas
vezes eu disse; “O filho de Dolores deveria ter sido meu.” Depois
eu conto por quê. A única coisa que quero dizer agora é que
alcançarei sua mãe em algum dos caminhos da eternidade.
Eu
achava que aquela mulher estava louca. Depois não achei mais nada.
Eu me senti num mundo distante e deixei-me arrastar. Meu corpo, que
parecia afrouxar-se, dobrava-se diante de tudo, havia soltado suas
amarras e qualquer um podia brincar com ele como se fosse de trapo.
— Estou
cansado — disse a ela.
— Antes
venha comer alguma coisa. Uma coisinha. Qualquer coisa.
— Vou.
Depois vou.
Juan
Rulfo, in Pedro Páramo
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