Ando
triste por umas coisas. Não no sentido literário. Minha literatura
anda bem. Nunca fui tão lido e tão pobre. Hoje saí de madrugada e
parei num barzinho 24 horas e comprei uma garrafa de conhaque
seresteiro. Fiquei na minha. Calado. Às vezes é bom ficar calado. É
como limpar as lentes do binóculo. Calado as coisas se desenham
melhor. E foi o que fiz. Sentei na última mesa e fiquei bebendo na
manha até uma porrada se instalar e tirar a minha paz. Não me
manifestei. Só observei os socos e pontapés. Aí o tempo passou. A
claridade começou a estuprar as janelas e na hora de amarrar os
cadarços e dar o fora, um dente, Isso mesmo. Vejo um canino intacto
perto de mim. Peguei o bicho. Limpei o sangue e guardei no bolso e
saí caminhando assobiando uma canção do Tom Zé. Aquela que fala
da “menina Jesus”. Uma linda canção. Lirismo puro. Aí antes de
acender meu último cigarro, vejo o cara que apanhou na briga
chorando sentado no banco da parada de ônibus: “E agora, Jesus?
Minha mulher vai me expulsar de casa. Ele não vai aguentar um bêbado
banguela”. Tiro o dente do bolso e falo pra ele: “Calma. Taqui
teu dente, cara. Um implante custa 800 reais em qualquer consultório
dentário. Chega em casa e dá um beijo na testa dela”. O cara
abriu um sorriso com os lábios inchados e me deu um abraço
demorado. Deus deve ter aberto um sorriso também. A alma de Deus não
tem dentes.
Diego
Moraes, in
ursocongelado.tumblr.com
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