terça-feira, 27 de outubro de 2015

Uma vida de "bagagem leve"


Mujica vive de maneira simples. Para ele, o material amarra, complica. E seu conceito de liberdade está associado, ao contrário da maioria dos mortais, a possuir apenas o indispensável para viver. “Se tenho uma casa pequena, se tenho pouco, são poucas as coisas com as quais preciso me preocupar”, disse à televisão pública holandesa em 2014.
Depois que o classificaram como “o presidente mais pobre do mundo”, Mujica se incomodou. De acordo com um de seus assessores mais próximos, o presidente passou um tempo sem querer falar com a imprensa sobre seus bens, preferindo se concentrar em temas da atualidade ou filosóficos. Era uma tarefa difícil — ou impossível, a não ser que simplesmente deixasse de falar com os meios de comunicação. Nenhum presidente do mundo vive como ele. Para um jornalista, a notícia é, em parte, um fato insólito, novo ou irreproduzível, e assim é Mujica em muitas de suas dimensões.
É um erro conceitual. Eu não sou pobre. Sou sóbrio, que é diferente”, disse ao entrevistador holandês. “É preciso ser humilde. As pessoas se acham o centro do universo e quando ocupam um cargo importante e tal... O mundo continua dando voltas sem a gente. A gente vai embora e não acontece nada”, resumiu.
Pobres são os que me descrevem. Minha definição é a de Sêneca: pobres são os que necessitam de muito; se precisa de muita coisa, é insaciável. Eu sou sóbrio, não pobre. Sóbrio. Com a bagagem leve. Viver com pouco, com o imprescindível. E não estar muito amarrado a questões materiais. Por quê? Para ter mais tempo. Mais tempo livre [...] para poder fazer as coisas de que eu gosto. A liberdade é ter tempo para viver. Então, há uma filosofia de vida na sobriedade que eu pratico. Mas não sou pobre”, respondeu em outra ocasião a uma repórter da emissora Al Jazeera, na declaração talvez mais clara sobre seu estilo de vida simples.
O desapego material de Mujica é conhecido e ele se encarrega de deixar claro, em discursos, entrevistas e ações, que se trata efetivamente de uma filosofia de vida.
Temos sacrificado os velhos deuses imateriais e ocupamos o templo com o ‘deus mercado’. É ele quem organiza nossa economia, a política, os hábitos, a vida e até financia em parcelas e cartões a aparência da felicidade. Parece que nascemos só para consumir e consumir e, quando não podemos, carregamos a frustração, a pobreza e até a autoexclusão”, disse aos colegas presidentes, em 2013, na Organização das Nações Unidas. “Parece que as coisas ganharam autonomia e submetem os homens”, concluiu Mujica em um dos discursos mais memoráveis dos últimos tempos em uma Assembleia Geral da ONU.
Mauricio Rabuffetti, in Mujica – a revolução tranquila

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