quarta-feira, 29 de julho de 2015

Não sabes nada de mim


Não sabes a força que têm os anjos, com um só dedo levantariam uma montanha, o que me vale é serem tão disciplinados, não fosse isso e já teriam organizado um complô para me deporem, Como satã, disse caim, Sim, como satã, mas a este já lhe encontrei a maneira de o trazer contente, de vez em quando deixo-lhe uma vítima nas mãos para que se entretenha, e isso lhe basta, Tal como fizeste a job, que não ousou amaldiçoar-te, mas que leva no coração toda a amargura do mundo, Que sabes tu do coração de job, Nada, mas sei tudo do meu e alguma coisa do teu, respondeu caim, Não creio, os deuses são como poços sem fundo, se te debruçares neles nem mesmo a tua imagem conseguirás ver, Com o tempo todos os poços acabam por secar, a tua hora também há-de chegar. O senhor não respondeu, mas olhou fixamente caim e disse, O teu sinal na testa está maior, parece um sol negro a levantar-se do horizonte dos olhos, Bravo, exclamou caim batendo palmas, não sabia que fosses dado à poesia, É o que eu digo, não sabes nada de mim.”
José Saramago, in Caim

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