Eu
tenho medo das “teses” quando se apoderam de um artista jovem,
sobretudo nos começos da sua carreira. E sabem o que eu temo? Muito
simplesmente que não consiga os objetos da tese. Pensará um
simpático crítico, a quem li há pouco e cujo nome agora não vou
citar, que toda a obra artística isenta de tese prévia, realizada
exclusivamente com um objetivo artístico, e até de assunto
inteiramente secundário e não correspondendo a nada de
“tendencioso” possa resultar nuns proveitos para o seu objetivo
ainda que à primeira vista dê a impressão de satisfazer apenas
“uma ociosa curiosidade”? Porventura as nossas pessoas cultas
ainda não se deram conta do que pode passar-se no coração e na
inteligência dos nossos escritores e artistas jovens? Que confusão
de ideias e de sentimentos preconcebidos!
Sob
a pressão da sociedade, o jovem poeta sufoca na alma o seu natural
anelo de espraiar-se em formas singulares; receia que condenem a sua
“ociosa
curiosidade”; reprime essas formas que lhe brotam do fundo da alma;
nega-lhes vida e atenção e arranca de dentro, entre espasmos,
o tema que à sociedade agrada, que é grato à opinião liberal e
social. Mas que erro tão horrivelmente cândido e ingênuo,
que erro tão crasso! Um dos mais grosseiros erros consiste em que a
denúncia do vício (ou do que ao liberalismo se antolha como tal) e
a incitação ao ódio e à vingança se consideram o único caminho
possível para a consecução do fim. Contudo, até mesmo nesse
exíguo caminho um grande talento poderia desenvolver-se e não se
afundar nos princípios da sua carreira; bastaria recordar-se mais
amiúde
da regra áurea, de que as palavras que se dizem são de prata e as
que se calam... são de ouro.
Há talentos notáveis que prometiam muito, mas a quem a tendência
corroeu de tal modo que lhes encaixou um uniforme.
Fiodor
Dostoievski,
in
Diário
de um Escritor
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