Fotograma da minissérie Grande sertão: veredas
“Diadorim
vinha constante comigo. Que viesse sentido, soturno? Não era, não,
isso eu é que estava crendo, e quase dois dias enganoso cri. Depois,
somente, entendi que o emburro era mesmo meu. Saudade de amizade.
Diadorim caminhava correto, com aquele passo curto, que o dele era, e
que a brio pelejava por espertar. Assumi que ele estava cansado,
sofrido também. Aí mesmo assim, escasso no sorrir, ele não me
negava estima, nem o valor de seus olhos. Por um sentir: às vezes eu
tinha a cisma de que, só de calcar o pé em terra, alguma coisa nele
doesse. Mas, essa ideia,
que me dava, era do carinho meu. Tanto que me vinha a vontade, se
pudesse, nessa caminhada, eu carregava Diadorim, livre de tudo, nas
minhas costas. Até, o que me alegrava, era uma fantasia, assim como
se ele, por não sei que modo, percebesse meus cuidados, e no próprio
sentir me agradecendo. O que brotava em mim e rebrotava: essas
demasias do coração. Continuando, feito um bem, que sutil, e nem me
perturbava, porque a gente guardasse cada um consigo sua tenção de
bem-querer, com esquivança de qualquer pensar, do que a consciência
escuta e se espanta; e também em razão de que a gente mesmo deixava
de excogitar e conhecer o vulto verdadeiro daquele afeto, com seu
poder e seus segredos: assim é que hoje eu penso. Mas, então, num
determinado, eu disse:
-“Diadorim,
um mimo eu tenho, para você destinado, e de que nunca fiz menção...”
- o qual era a pedra de safira, que do Arassuaí eu tinha trazido, e
que à espera de uma ocasião sensata eu vinha com cautela guardando,
enrolada numa pouca de algodão, dentro de um saquitel igual a de um
breve, costurado no forro da bolsa menorzinha da minha mochila.”
Guimarães
Rosa,
in Grande
sertão: veredas
Adoro essa história...
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