“Rocamadour,
já sei que és como um espelho. Estás dormindo ou olhando os pés.
Eu aqui seguro um espelho e creio que és tu. Mas não acredito
nisso, escrevo-te porque não sabes ler. Se soubesses, não te
escreveria ou escreveria coisas importantes. O dia chegará em que
terei de escrever para recomendar que tu te comportes ou que te
agasalhes. Parece incrível que alguma vez Rocamadour. Agora, somente
te escrevo no espelho, de vez em quando tento secar o dedo, porque
fica molhado com as lágrimas. Por que, Roucamadour? Não estou
triste, tua mamãe é uma tola, queimei o borsch
que
tinha feito para Horacio; sabe muito bem quem é Horacio, Rocamadour,
é aquele senhor que, no domingo, levou-te um coelhinho de feltro e
que se aborrecia muito porque tu e eu falávamos tanto e ele queria
voltar a Paris; foi então que começaste a chorar e ele mostrou como
o coelhinho mexia as orelhas; nesse momento, ele ficou muito bonito,
estou falando de Horacio, algum dia compreenderás, Rocamadour.”
Julio
Cortázar,
in O
jogo da amarelinha
Nenhum comentário:
Postar um comentário