sábado, 31 de janeiro de 2015

Da necessidade de um senhor (Sexta Proposição)

“(...) O homem é um animal que, quando vive entre outros de sua espécie, tem necessidade de um senhor. Pois ele certamente abusa de sua liberdade relativamente a seus semelhantes; e, se ele, como criatura racional, deseja uma lei que limite a liberdade de todos, sua inclinação animal egoísta o conduz a excetuar-se onde possa. Ele tem necessidade de um senhor que quebre sua vontade particular e o obrigue a obedecer à vontade universalmente válida, de modo que todos possam ser livres. Mas de onde tirar esse senhor? De nenhum outro lugar senão da espécie humana. Mas este é também um animal que tem necessidade de um senhor. Seja qual for o começo, não se vê como o homem pode se dar, para estabelecer a justiça pública, um chefe que também seja justo - ele pode procurá-lo numa única pessoa ou num grupo de pessoas escolhidas para isso. Pois todos eles abusarão sempre de sua liberdade, se não tiverem acima de si alguém que exerça o poder segundo as leis. O supremo chefe deve ser justo por si mesmo e todavia ser um homem. Esta tarefa é, por isso, a mais difícil de todas; sua solução perfeita é impossível: de uma madeira tão retorcida, da qual o homem é feito, não se poder fazer nada reto. Apenas a aproximação a esta ideia nos é ordenada pela natureza. Que ela seja aquela que será realizada por último decorre disto: que ela exige conceitos exatos da natureza de uma constituição possível, grande experiência adquirida através dos acontecimentos do mundo e, acima de tudo, uma boa vontade predisposta a aceitar essa constituição - estes três pontos, todavia, muito dificilmente podem ser encontrados juntos e, quando isto acontece, ocorre somente muito tarde, após muitas tentativas frustradas.”
Immanuel Kant, in Ideia de uma história universal de um ponto de vista cosmopolita

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