Bandeirinhas e mastros (década de 60), de Alfredo Volpi
Não projetar na tela os discursos
prontos ou toda a erudição da história da arte. Você estaria vendo com olhos
alheios, que poderiam induzi-lo a ver coisas de que a obra não fala e deixar de
ver a própria obra. É preciso ver com olhos inocentes.
Contudo, inocência não significa ignorância, mas ausência de preconceitos. A prender
a ver é desvestir a alma.
Cada arte tem sua linguagem. A música
fala através do som/silêncio; a pintura, através de cores, linhas e formas; o
cinema, através da imagem-pensamento no tempo. A essa materialidade o artista – usando metáforas, paródias, alegorias –
empresta uma transcendência. O resultado é o que chamamos forma artística. Entretanto,
não existem regras para se ver um quadro.
A linguagem da pintura não se
presta a argumentações. A pintura não é um enunciado científico, nem
ideológico, nem moral. O que não impede, como vimos, que se preste a tudo isso,
mas no sentido de funções secundárias.
Não se deve buscar uma única
mensagem na pintura, pois a grande obra pode conter várias ou nenhuma. Mais do
que denotativos (de conteúdo meramente informativo), os signos da pintura
tendem para a conotação (ideias associadas, sugestão ao leitor de uma visão de
mundo). É preciso entender que uma pintura pode revelar o inconsciente, seja do
artista, seja de uma cultura, e que ela brota no limite entre real e
imaginário. Do mesmo modo, é preciso entender que uma pintura só alcança o
universal se estiver fundada no particular. O universal sem o particular é
vazio. As bandeirinhas de Alfredo
Volpi apresentam tanto a alma provinciana do habitante de uma cidadezinha do
interior como a de qualquer indivíduo sensível. Partindo da expressão popular
das formas naturais, alcança a sofisticada abstração de formas dos artistas de
vanguarda. Por último, entender que arte não é tradução, não é espelho do
artista ou da realidade. É construção e criação de signos novos, doadora de
sentidos. É uma forma do ser.
Tomando-se
esses cuidados, é possível ir em busca de informações dos estudiosos da arte,
críticos, estetas e historiadores, compreendendo o que disseram da obra,
ampliando a nossa percepção da própria obra. Entretanto, essas informações, embora
valiosas, são sempre complementares. Importa, antes, ver a obra com empatia e
com o próprio espírito. Claro que um espírito mais rico aprecia mais e
experimenta um prazer mais profundo.
Maria José Justino, in Para filosofar
Muito bom!
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