Um
magnífico Jatobá vivia a sua vida galhofeira (1) cercado de uma multidão de
juncos farfalhantes, à beira de um riacho riachante. Orgulhoso de sua imensa
copa, ele a abanava a todos os ventos de todas as partes e, de vez em quando, é
natural, aproveitava para fazer uma sombra indevida aos juncos que lhe ficavam
em volta (2). Os juncos, às vezes, querendo saber onde andava o sol pra
calcular em quanto tempo iriam se livrar do destino sombrio, perguntavam ao
imenso Jatobá: “Que horas são, amigo?” “Eu não sou amigo e não digo horas pra
juncos encharcados”, respondia invariavelmente o Jatobá. Os juncos, humolhados(3),
voltavam ao seu farfalho humilde, enquanto o Jatobá apregoava aos grandes
companheiros das matas a glória de sua cabeleira centenária. A vida é assim.
Mas
lá chega o dia...
Esse
dia foi de noite. Um vendaval daqueles de derrubar até torres de arranha-céu,
se arranha-céu já existisse. O Jatobá, cuja imensa galhada oferecia uma
resistência gigantesca(4) às forças da natureza, veio ao chão num estrondo
assustador. O chefe dos juncos, vendo aquele desastre com o gigante, gritou
sabiamente pro seu grupo: “Não resistam! Agachem-se!”(5).
Tombado,
o Jatobá foi arrastado pela corrente do riacho até uma serraria, onde
imediatamente o transformaram em magníficas cadeiras de jacarandá. Mas os
juncos, que riam satisfeitos, dançando ao sol da manhã de abril, sem a
cobertura do Jatobá foram logo descobertos por empalhadores, que os arrancaram
a todos e os utilizaram para empalhar cadeiras.
Espicaçados
pelo vírus da filosofia, os juncos não resistiram e perguntaram a uma cadeira:
“Você sabe explicar por que a queda dos poderosos é mais terrível do que a dos
mais fracos, mas no fim todo mundo cai?” E a cadeira respondeu sem hesitar: “Eu
não falo com junco!”.
MORAL:
Orgulho não adianta; sempre se acaba com a bunda de alguém em cima.
1 – Cheia de galhos, e gozadora.
2 – Afinal, de que vale nossa alegria sem a infelicidade alheia?
3 – Quer dizer, amargurados dentro d’água.
4 – Quinta lei de dinâmica da prepotência.
5 – Segundo parágrafo do artigo primeiro da lei da sobrevivência política.
2 – Afinal, de que vale nossa alegria sem a infelicidade alheia?
3 – Quer dizer, amargurados dentro d’água.
4 – Quinta lei de dinâmica da prepotência.
5 – Segundo parágrafo do artigo primeiro da lei da sobrevivência política.
Millôr
Fernandes, in Fábulas fabulosas
Nenhum comentário:
Postar um comentário