Atirei um limão n’água
e fiquei vendo na margem.
Os peixinhos responderam:
Quem tem amor tem coragem.
e fiquei vendo na margem.
Os peixinhos responderam:
Quem tem amor tem coragem.
Atirei
um limão n’água
e caiu enviesado.
Ouvi um peixe dizer:
Melhor é o beijo roubado.
e caiu enviesado.
Ouvi um peixe dizer:
Melhor é o beijo roubado.
Atirei
um limão n’água,
como faço todo ano.
Senti que os peixes diziam:
Todo amor vive de engano.
como faço todo ano.
Senti que os peixes diziam:
Todo amor vive de engano.
Atirei
um limão n’água,
como um vidro de perfume.
Em coro os peixes disseram:
Joga fora teu ciúme.
como um vidro de perfume.
Em coro os peixes disseram:
Joga fora teu ciúme.
Atirei
um limão n’água
mas perdi a direção.
Os peixes, rindo, notaram:
Quanto dói uma paixão!
mas perdi a direção.
Os peixes, rindo, notaram:
Quanto dói uma paixão!
Atirei
um limão n’água,
ele afundou um barquinho.
Não se espantaram os peixes:
faltava-me o teu carinho.
ele afundou um barquinho.
Não se espantaram os peixes:
faltava-me o teu carinho.
Atirei
um limão n’água,
o rio logo amargou.
Os peixinhos repetiram:
É dor de quem muito amou.
o rio logo amargou.
Os peixinhos repetiram:
É dor de quem muito amou.
Atirei
um limão n’água,
o rio ficou vermelho
e cada peixinho viu
meu coração num espelho.
o rio ficou vermelho
e cada peixinho viu
meu coração num espelho.
Atirei
um limão n’água
mas depois me arrependi.
Cada peixinho assustado
me lembra o que já sofri.
mas depois me arrependi.
Cada peixinho assustado
me lembra o que já sofri.
Atirei
um limão n’água,
antes não tivesse feito.
Os peixinhos me acusaram
de amar com falta de jeito.
antes não tivesse feito.
Os peixinhos me acusaram
de amar com falta de jeito.
Atirei
um limão n’água,
fez-se logo um burburinho.
Nenhum peixe me avisou
da pedra no meu caminho.
fez-se logo um burburinho.
Nenhum peixe me avisou
da pedra no meu caminho.
Atirei
um limão n’água,
de tão baixo ele boiou.
Comenta o peixe mais velho:
Infeliz quem não amou.
de tão baixo ele boiou.
Comenta o peixe mais velho:
Infeliz quem não amou.
Atirei um limão n’água,
antes atirasse a vida.
Iria viver com os peixes
a minh’alma dolorida.
antes atirasse a vida.
Iria viver com os peixes
a minh’alma dolorida.
Atirei um limão n’água,
pedindo à água que o arraste.
pedindo à água que o arraste.
Até os peixes choraram
porque tu me abandonaste.
porque tu me abandonaste.
Atirei um limão n’água.
Foi tamanho o rebuliço
que os peixinhos protestaram:
Se é amor, deixa disso.
Foi tamanho o rebuliço
que os peixinhos protestaram:
Se é amor, deixa disso.
Atirei um limão n’água,
não fez o menor ruído.
Se os peixes nada disseram,
tu me terás esquecido?
não fez o menor ruído.
Se os peixes nada disseram,
tu me terás esquecido?
Atirei um limão n’água,
caiu certeiro: zás-trás.
Bem me avisou um peixinho:
Fui passado pra trás.
caiu certeiro: zás-trás.
Bem me avisou um peixinho:
Fui passado pra trás.
Atirei
um limão n’água,
de clara ficou escura.
Até os peixes já sabem:
você não ama: tortura.
de clara ficou escura.
Até os peixes já sabem:
você não ama: tortura.
Atirei
um limão n’água
e caí n’água também,
pois os peixes me avisaram,
que lá estava meu bem.
e caí n’água também,
pois os peixes me avisaram,
que lá estava meu bem.
Atirei um limão n’água,
foi levado na corrente.
Senti que os peixes diziam:
Hás de amar eternamente.
foi levado na corrente.
Senti que os peixes diziam:
Hás de amar eternamente.
Carlos Drummond de Andrade
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